Manuel Igreja

Manuel Igreja

As casas que não temos

Demorou, mas chegou. Andava o governo da nação entretido a remediar e a remendar e eis se não quando, surgiu com a primeira medida estruturante das muitas de que o país necessita como de pão para a boca.

Cloro que sendo este nosso país de hoje- em -dia e não só de agora, mais uma federação de lóbis e corporações do que uma nação, de imediato surgiram reações destemperadas e a quente que se não esbateram, pouco se rebateram e muito se espalharam.

Interessados e interesseiros, fizeram cair o Carmo e a Trindade mais parecendo que a coisa para todos não ajuda a ninguém, com exceção, digo eu, daqueles que já esperam com as abadas abertas que lhes caiam mais uns trocos sem que seja preciso fazer nada a não ser pedir.

Indo à coisa propriamente dita tenho para mim que no fim e no resto pouco mais se fará do que um se espalhar de mais subsídios justos e imprescindíveis em alguns casos, mas que grosso modo, unicamente contribuem para o formatar de posturas de comatosas dependências que impedem o romper do círculo fechado do remedeio e da pobreza feita fado.

Na espuma da discussão, tocaram a rebate os sinos por mor do chamado arrendamento forçado, com clamores de lesa propriedade apesar de este direito nunca ter sido colocado em perigo. Aludiu-se ao teor sagrado desta, como se ela fosse axioma e dogma, mesmo que o não seja dado que sendo um inalienável direito, não pode dar direito a tudo.

A propriedade não tem o estado de forma cristalizada. Pelo menos quanto a mim que pouco sei, pode e deve ser questionada quando colide com a liberdade e os diretos que são de todos. Por exemplo, um cidadão pode indignar-se e questionar um edifício prolongadamente em ruínas que degrada a rua da sua cidade prejudicando tudo e todos muito mais quando a beleza de uma terra é um ativo turístico que acrescenta valor coletivo.

Aliás sobre este ponto nem sequer acredito na sua exequibilidade por causa dos labirintos da burocracia que só existe para resolver problemas que não existiriam se não houvesse burocracia. Não será, pois, daí que resultará remédio que se veja para o minorar do problema da falta de habitação quotidiana para quem a procura.

Outro alarido veio do setor do Alojamento Local, uma solução expedita e eficiente para se dar resposta à procura de dormidas e de o melhor dinheiro a ganhar com o aluguer de espaços para se deitar a cabeça em travesseiros de ocasião com banhos quentes ao dispor.

Obviamente que se não pode questionar a legalidade nem o sentido de oportunidade para nem falar no direito de assim se fazer por parte de quem usa e de quem disponibiliza pois cada qual sabe as linhas com que se cose e não tem o dever de se preocupar com os rasgões nas roupas alheias.

Claro que todos sabemos também que graças a essa atividade se recuperaram casas em ruínas e se deu novo colorido às ruas das nossas cidades, num exercício de dar e vender que acrescenta valor económico individual e nacional.

No entanto e também quanto a mim a discussão não se esgota aí, mais não seja porque o seu regulamentar na oferta não significa o seu fim enquanto forma de atividade económica. Pode e deve continuar a existir. Não pode é grandemente por si colocar em perigo e inquestionável fim primeiro que é que advém do facto de as casas serem antes de tudo para os cidadãos da pólis moraram.

Se um país de esquece que antes do ganho imediato de alguns resultante de algo que não é estruturante, mas é mais fácil, logo se torna um país prostituto que não cuida dos caminhos que levam ao futuro porque vende aos de fora os seus encantos sem cuidar devidamente dos seus transformados em meros serventes de gente mais rica que usa e deita fora.

O governo fez um rascunho, uns apontamentos e lançou a discussão que logo se embrulhou em grande confusão. Não vai e não vamos ser capazes na próxima década de remediar o problema das casas que não temos. Nem Portugal seria o que é se o fossemos.

Contudo embandeirados que andamos com o Turismo que vai sendo a nossa sorte no jogo, é tempo de se pensarem os caminhos do futuro que já não é o que sempre foi. Ainda que ele deva continuar presente, não pode ser a modos de dizer o único setor que dá estrutura ao país por ser intrinsecamente volátil.

Não existe nenhum país onde o Turismo seja sobremaneira a forma de vida nacional sem que os seus cidadãos estejam na condição de filhos deuses menores.

Neste andar, virá um tempo em que em Portugal haverá mais lodo no cais do que vazos de flores em janelas abertas e floridas. Mesmo que haja muito sol.



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