Manuel Igreja

Manuel Igreja

A pensar morreu um burro

O AFEGANISTÃO é a nossa vergonha. É o inverno do nosso descontentamento, a prova de que o ser humano ainda que vá à Lua e tente ir a Marte ainda não atingiu a primavera do desenvolvimento. Está mentalmente nos primórdios da evolução.

De um lado, na banda mais escura, temos gente com o cérebro cristalizado e alimentado a horror porque inventou um Deus de quem recebe supostas orientações de purificação através da leitura deturpada de um Livro orientador que mais não faz do que abrir as portas do inverno na Terra.  

O sofrimento e a perda dos tidos como impuros, são para aquela gente as pedras da calçada que acaba no paraíso onde mil virgens para cada qual esperam ansiosas e prontas para a recompensa da vil obra assente em intolerância e barbárie, como se ser bárbaro e cruel fosse o destino dos homens maiores.   

Do outro lado, do nosso, temos pessoas aperaltadas, com ar inteligente, que passam a vida a congeminar estratégias e a secretamente consultar estrategos, mas vai-se a ver e mais não sai do que asneira seguida de asneira cada vez pior e nunca para melhor.

Obviamente que nas coisas da geoestratégia nada é o que parece e quase nunca o que se diz, mas o certo e não muda é que as vítimas são sempre as mesmas e do mesmo cariz. Isto é, os que nada podem fazer, nada pode influenciar e a quem só resta sofrer inenarráveis consequências. Filhos de um deus menor cego ou pelo menos distraído.

O que se está a passar no Afeganistão, geograficamente longínquo, mas ao pé da nossa porta em termos de nefastas influências não se pode ter como recuo civilizacional, porque quase não houve avanço e é algo de esperado e repetido. As trevas e os interesses escusos e à medida de cada qual campeiam com os interesses de cada tribo a sobreporem-se à noção de justiça e de igualdade.

Dá-se o caso que o Estados Unidos da América, terra admirável e admirada no ocidente, ao longo de vinte anos, despejaram baldes de dólares no Afeganistão a fim de naquele martirizado país onde a guerra é uma permanência, serem constituídas estruturas de governo estruturado e forças armadas credíveis e capazes de darem teor e vigor a um Estado propriamente dito.

No entanto, assim que foi anunciada a retirada dos militares ocidentais, os governantes e os militares afegãos, corruptos e corrompidos, meteram a viola no saco, penduram as metralhadoras, passaram-se para o lado dos temidos e terríveis talibãs obscurecidos e obscurecedores.

Estes que estavam à toca, sustentados pelas receitas do ópio por lá cultivado e pelos perdidos ocidentais consumidores da droga que negoceiam, como quem faz um safari nas suas carrinhas de caixa aberta portadoras de metralha e de morte, rumaram à capital e assenhoram-se do Poder seguindo os preceitos escuros das suas torpes mentes.   

Foi coisa de um par de dias. O inferno de portas abertas instalou-se perante a nossa assassina impotência, com o presidente americano a dizer que pensou sempre que os aliados afegãos resistiriam a qualquer ofensiva dos demónios de turbante depois da retirada dos ocidentais.       

Infeliz e vergonhosamente foi o que se viu e mais o que falta para se ver, pois, a procissão ainda vai no adro.

Quando andava na escola primária, se um aluno ao errar resposta se desculpava dizendo que pensava que…,logo a professora retorquia que a pensar morreu um burro.

Deparasse eu com o senhor Joe Biden, e no mínimo era o que lhe dizia. Como não vou ter esse gosto, só me resta lamentar o avanço da barbárie e a falta de estadistas que não temos porque não os exigimos, não os sabemos escolher e não os sabemos criar. Somos todos culpados.            

 


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