Luis Ferreira

Luis Ferreira

Crime e castigo sem vergonha

Na insofismável tendência que envolve a natureza humana para se diminuir ou engrandecer, humilhar ou ser superior, deparamos com exemplos abomináveis de uma e de outra vertente que nos chocam e nos tornam irascíveis descontrolando os nossos egos. Causas são várias e culpas ninguém a quer.

A verdade é que se jogam no palco europeu e mundial jogos demasiado perigosos, assustadores e destruidores, arrastando a dignidade humana para um campo de lama imenso de onde, demasiado tarde se poderá, quiçá, levantar com as mazelas condizentes à sua nova condição.

Estamos todos fartos de viver uma guerra que não sendo nossa também o é, que nos entra pela casa dentro com os contornos horríveis que uma guerra obviamente tem, que nos incomoda, que nos irrita e nos transforma em seres capazes de levar a cabo o que nunca faríamos em estado normal. Ficamos fora de nós próprios e envoltos num ódio terrível por quem deflagrou um conflito contra quem nada fez para o merecer. As razões, sejam elas quais forem e certamente os beligerantes as terão, nenhuma justificaria uma guerra desta natureza. Aliás, nenhuma guerra tem justificação.

No palco desta Europa vive-se uma guerra que vem pôr a claro falhas graves de um e de outro lado do palco, revelando que a Europa não estava minimamente preparada para este tipo de conflito. Porquê? Porque nunca nenhum país da União pensou que houvesse uma nova guerra no seu território e por isso mesmo não se preparou para essa eventualidade. Agora está a sofrer as consequências dessa incúria. Corre atrás do prejuízo e as alternativas não são nada boas nem fáceis de tomar. Porquê? Porque a Europa depende e muito dos países que estão em conflito. A Rússia e a Ucrânia. Um abastece a Europa de energia, gás, petróleo e cereais e o outro abastece o Mundo de cereais. Isto faz com que a guerra se alastre para outros continentes nomeadamente o africano onde a fome se agrava.

Lançadas as sanções contra a Rússia, elas não serão suficientes para impedir estas consequências, já que ela é demasiado grande e orgulhosa para reconhecer que errou, ou não, e acabar com as atrocidades que está a cometer. A paz está longe, muito longe e a revelação dos crimes de guerra que estão a ser divulgados pelo Mundo inteiro em nada ajudam a que a Rússia os admita e se rendas às evidências. Sabe que os comete, sabe que castiga inocentes, sabe que já matou milhares de civis, mas não admite nada como seu. Não tem vergonha nenhuma.

Os supostos crimes de guerra que nos têm sido apresentados pela comunicação social e a forma como são revelados, são aterradores, arrepiantes. Como é possível levar a cabo tão hediondos crimes? Como é possível matar a sangue frio pessoas que nada fizeram, idosos, jovens, só porque um louco os mandou arrasar tudo por onde passassem? É fácil saber quem tem culpas, mas não admitem nem nunca admitirão. As culpas merecem castigo e eles não querem ser castigados. Mas sê-lo-ão certamente um dia.

A esta altura já com cinquenta dias de guerra, não se vislumbra um cessar-fogo. Putin quer obter uma vitória, seja lá ela qual for, mas até agora não conseguiu nada de especial a não ser destruir vilas e cidades e matar só por matar. Mariupol está desfeita, mas os chamados neonazis ucranianos resistem e talvez seja por isso mesmo, que a Putin os quer aniquilar e talvez seja essa a razão proferida como justificação da invasão: acabar com a nazificação na Ucrânia. Também não concordamos, com toda a certeza, com este tipo de especificação militar. Já nos chegou Hitler e o que conseguiu fazer em nome desse suposto partido durante a Segunda Guerra Mundial. Basta. Mas isso nunca pode justificar o início de uma guerra. É evidente que o interesse da Rússia se prende com o porto de mar e o acesso ao mar de Azov e ao mar Negro que, ao ser conseguido, deixará a Ucrânia sem porto de mar para fazer as suas exportações. Seria uma machadada enorme na sua economia externa. Putin pode expor todas as suas razões, mas ninguém é burro para não entender os seus propósitos. Ele não quer a Ucrânia. Ele quer uma Ucrânia dependente do seu poder, submissa e que sirva de tampão aos interesses do Ocidente e dos países da Nato. Só isso. Uma Ucrânia destruída, para ele nada serve, pois não tem possibilidades de a reconstruir. Quem vier depois que faça esse serviço. Ele jamais o fará.

Contudo, os seus objetivos parecem não estar a ser atingidos e as baixas estão longe do esperado, quer em soldados, quer em material bélico. Isto tudo é mais do que suficiente para irritar o grande chefe. Agora é só destruir e matar por onde passar. Nada interessa. Não tem vergonha, não tem que justificar nada, pode cometer os crimes de guerra que quiser, pois ninguém o julgará. No fundo, ele sabe que não será castigado por isso. E vergonha nem sequer precisa de o demonstrar, porque teria de se esforçar demasiado e não conseguiria. Enfim.


Partilhar:

+ Crónicas

Ondas Negras

A aventura de Ventura

Sem trunfos na manga

Indecisões

Sem tempo e sem palavras

Por trás da corrupção

Trapalhas em S. Bento

50 amos de memórias

E se acorda rebentar?

E agora?