Dizem que são mais do que as nozes, as vozes. Não sei, mas devem ser, mais a maia até porque o ditado popular já vem de longe, como todos os outros firmados pelo saber de quem quando havia disponibilidade para deixar escorrer o tempo, olhando e observando ia aprendendo e ia chegando a conclusão.
Acerca das nozes, o que sei, é que há algumas vindas diversas partes do mundo para consumo de quem as aprecia, e mais as que algum felizardos ainda têm numa nogueira no quintal, majestática como deve ser, e disponível para proporcionar uma retemperante sombra nos dias de canícula em que até parece que se abriram as portas do inferno.
Se virmos bem, é o caso destes dias em que o verão não está para brincadeiras e para grandes andanças. As pedras da calçada até fervem, e uma varanda até pode servir de fogão se uma pessoa se der ao trabalho de colocar nela uma panela para cozinhar um leve arroz, daqueles de se comer e chorar por mais. Mais parece que quem manda nos botões da regulação do clima anda distraído.
A questão no que a isto se refere, ao escancarar das portas do inferno, perante o que diariamente vamos vendo a acontecer em nosso redor, qualquer pessoa de bom senso e sem a mente cristalizada por crenças enfeitiçadas ou por ideologias mal estruturadas, só pode concluir com preocupação que anda o diabo à solta e que o inferno está em quase toda a parte.
Indo às vozes, às que se ouviram, às que ouvem e às que se ouvirão, o que se me surge para dizer, é que umas que se ouviram jamais deviam ter sido ouvidas por causa dos enormes horrores que causaram, outras que se calaram ou que foram caladas deviam tido sido ouvidas, e que outras que foram menosprezadas e ignoradas deviam ter sido valorizadas.
Tudo isto, num processo dinâmico que se repete a cada momento, numa medida de tempo em que o presente vira passado num ápice, e o futuro se apresenta com as suas características com uma visão de eternidade para cada um de nós no quotidiano com percalços e à cata de soluções e de emoções para que o viver seja algo mais que se estar vivo.
Os doutores nas coisas da evolução, ensinam-nos que a nossa voz começou por ser um ruído grotesco e sem leitura, sem mensagem que se percebesse. No entanto, dizem, foi uma questão de tempo, de umas meras centenas de milhares de anos, um saltinho no ponteiro do relógio cósmico, até que os roncos, com o devido respeito pelos nossos milenares avós, começassem a ter significado e sentimento entendidos.
A partir daí, a voz é o que sabemos. Serve-nos para escoar as emoções, para asselar ou para acalmar os corações, para vilipendiar ou para fazer respeitar, para fundamentar argumentações, para enganar ou para ser enganado, para fazer zangar ou para apaziguar, para ajudar a fazer a paz, para acender e para espalhar os horrores da guerra.
A voz, também serve para descrever o voo da gaivota louca que acha que pode chegar ao sol, para dizer dos meninos em volta da fogueira, das madrugadas redentoras e das noites aterradoras, para nos dizer as maravilhas que surgiram e se viram, mas também das adivinhadas para os dias ainda por acontecer, porque vamos aprendendo, sabendo e crendo que não há machado que corte a raiz do pensamento.
Não sei neste ponto, se as vozes são mais do que as nozes. Mas não conta. Só quero é que a nossa voz seja sempre livre, que continue a haver nozes para juntarem a um cálice de vinho fino, e para seja feito um bolo delas, daqueles que fazem os anjos batendo as asas se roeram de inveja. Claro, se souberem o que isso é.
Não bebam água muito gelada para não estragar a voz e filtre algumas, pois nem todas são sadias e vêm envenenadas, e tenham cuidado no britar de cada noz para que a luzida casca não cause dano no corte. Digo eu.