Reflexão sobre a proibição dos telemóveis nas escolas.
Imagine-se um cenário de apagão prolongado por dias. Imagine-se que, por algum motivo, voltávamos ao tempo anterior à eletricidade. Ou, à época sem telemóveis. Seria, sem dúvida, um retrocesso civilizacional com profundas consequências para a organização social, económica e cultural.
É nesse contexto que importa refletir sobre as propostas de exclusão total dos telemóveis das escolas. Se reconhecemos que o acesso à tecnologia e à informação é hoje um dos pilares do progresso individual e coletivo, e que a literacia digital é uma competência essencial para as gerações atuais, então não deveríamos tratar o telemóvel apenas como uma distração, mas como uma ferramenta essencial ao desenvolvimento dos jovens.
Ao invés de proibir, é necessário educar para o uso responsável do telemóvel. Uma utilização controlada. Uma solução razoável, seria adotar, por exemplo os alunos depositarem os telemóveis no início das aulas e levantá-los no final, garantindo um ambiente de aprendizagem focado exclusivamente na aula, mas com possível utilização nos intervalos e hora de almoço.
Já pensaram na ansiedade que se pode criar, ao não deixar interagir nas redes sociais? Essa conexão já faz parte do quotidiano. Retirar completamente os dispositivos é como negar a uma geração o contacto com as ferramentas do seu tempo. Não podemos preparar os jovens para o futuro impedindo-os de viver no presente. A chave não está na exclusão, mas na integração consciente e pedagógica das tecnologias no ambiente educativo.
Depois, introduzir proibições que não podem ser verificadas! Os jovens, pela sua irreverência e predisposição a contrariar regras, torna-se desafiante a utilização e até uma demonstração de coragem que outros seguiriam.
Retirar o telemóvel por completo é como querer ensinar navegar proibindo o uso da bússola, ou do GPS. A geração que hoje está na escola é a primeira verdadeiramente nativa digital. A educação que lhes devemos não é a de retroceder ao passado, mas a de aceder ao futuro com sentido crítico, responsabilidade e criatividade.
No entanto, é com esse espírito que alguns discursos atuais sobre educação parecem encarar os jovens e a tecnologia, como se o progresso fosse o problema. A crescente pressão para proibir completamente os telemóveis nas escolas, muitas vezes em nome da concentração e da disciplina, ignora uma realidade fundamental: o futuro está na tecnologia, não na sua negação.
Todos nos lembramos de quando se proibia o uso das máquinas de calcular, e depois passaram a ser exigidas.
A resposta educativa não deve ser a proibição cega. Educar é preparar para o mundo. A literacia digital é hoje tão importante quanto a literacia tradicional, uma não substitui a outra, elas complementam-se.
Tal como defende Maslow: “uma necessidade satisfeita deixa de motivar, mas, se for retirada, volta a causar desmotivação”. Podemos inferir que o telemóvel, por si só, não motiva nem distrai, mas, retirado de forma abrupta, pode tornar-se fonte de desmotivação e conflito. Os pais e professores é isso que pretendem?
Se queremos cidadãos capazes, temos de confiar-lhes ferramentas e ensiná-los a usá-las. E, porque não a escola adaptar-se às novas tecnologias?