Manuel Igreja

Manuel Igreja

Os Descontos nas Portagens e a Inveja

Os autarcas do litoral, pelo menos alguns, são uns invejosos. Mal o governo anunciou uns pequenos descontos nas portagens nas autoestradas do interior, umas migalhas, logo eles vieram a terreiro dizer que também querem. Coitados, passe o termo, também se sentem residentes em território menosprezado e até isolado assim ao jeito de quem está por detrás do sol-posto.

Compreende-se no entanto com algum esforço a atitude. Não passa de um gesto político para marcar posição perante os respectivos eleitores. Contudo, não é que isso interesse muito, a mim incomodou-me. Sou do interior, vivo no interior, olho, e não vejo onde é que viver junto ao mar ou para cá do Marão tenha algo a ver quando se fala de condições de vida que o Estado possibilita.

Somos todos iguais no que toca a pagar impostos, mas tenham santa paciência. Há uns mais iguais que outros quando toca à criação de infraestruturas sejam elas de que tipos forem. Mais não seja, o número de utentes, de pessoas, conta, e acima de tudo o número de cruzinhas nos boletins de voto conta ainda mais. Somos todos cidadãos de pleno direito, mas somos diferentes nos cuidados que nos tem quem decide. Consequências da democracia que não tem só coisas boas.

Só para fundamentar a ideia de que nós por cá recebemos justiça quando nos discriminam positivamente, basta por exemplo que se refira que uma pessoa que trabalhe no Porto e viva em Espinho, ou em Ermesinde, pode deslocar-se de casa para o emprego e vice-versa num confortável comboio pelo preço mensal de meia manhã de trabalho.

No entanto, quem viva por exemplo na Régua e tenha de se deslocar para Vila Real por causa da vida profissional, obrigatoriamente tem de viajar de carro, com um custo equivalente a uma semana de ordenado. Isto se ganhar um pouco acima da média, se não, fica-lhe na estrada grande parte do dinheiro auferido.

Tendo-se construído as vias de circulação com o dinheiro de todos, sendo elas mantidas em exploração de igual forma, já que o custo dos passes não cobre o encargo total, e ainda bem, logo eu e o senhor ou senhora que isso leem, caso morem por cá, pelo interior, ajudamos na deslocação aos de lá. No fundo é o que tem de ser e está certo. Os impostos são para isso mesmo. Não são é para pagar bancos que gestores inteligentes desbarataram à tripa forra. Mas são, infelizmente.

Fazendo agora a volta de retorno no escrito para as portagens. Fizeram-nos uns descontos que nem para comprar uma caixa de lumes dão. Nem chega para as mortalhas se fumarmos cigarros de enrolar. Julgam que nos enrolam. A nós que passamos a vida a ser enrolados. A páginas tantas puseram-se a construir coisas sem rei nem roque. Agora chegam as contas e pagam sempre os mesmos.

No que se refere às portagens das autoestradas, proibitivas da circulação desimpedida que se impõe para o verdadeiro e equilibrado desenvolvimento regional, a ser assim quase apetece dizer que valia mais não se terem dado ao trabalho de as construir. No fundo, é como se tivéssemos um carro desportivo na garagem parado por falta de dinheiro para a gasolina. Evitamos andar nelas.

A questão em mesma, quanto a mim simples curioso, está mal colocada desde o início da discussão. O ponto nunca devia ter sido se se paga ou não portagens nas antigas SCUT´S. É mais simples. Deve pagar-se o razoável, mas já que tudo se deslocou para as antigas cidades capitais de distrito, os residentes de cada um, porque obrigatoriamente têm de se deslocar dentro do seu, pura e simplesmente não deve pagar. No resto paga como os outros que é para aprender a não deixar desmantelar o caminho-de-ferro.

Portugal é um dos países com melhores acessibilidades rodoviárias. São de meter inveja a qualquer estrangeiro que cá pare. Por isso, deixemo-nos de invejas pois é um grande pecado. Muito mais quando nasce e se espalha entre nós. Infelizmente já é mal antigo.


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