O investigador Edgar Bernardo estudou o barro preto de Bisalhães e concluiu que, quatro anos depois da distinção da UNESCO, continuam a “não existir” estratégias de promoção e consumo da olaria adaptadas à atividade turística.

O processo de fabrico do barro preto de Bisalhães, aldeia do concelho de Vila Real, foi inscrito a 29 de novembro de 2016 na lista do Património Cultural Imaterial que necessita de salvaguarda urgente da UNESCO.

A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) divulgou hoje, em comunicado, que o bolseiro do projeto "Dourotur" Edgar Bernardo dedicou a sua tese de doutoramento ao tema “Patrimonialização e Turismo Cultural no Douro: o caso do barro de Bisalhães”.

A patrimonialização é a atribuição do estatuto de património a um bem material ou imaterial, reconhecendo-lhe interesse (cultural, histórico, etc.).

Na sua investigação de doutoramento, Edgar Bernardo concluiu que, praticamente quatro anos depois da distinção, “continuam a não existir estratégias adequadas para a promoção e consumo da olaria adaptadas à atividade turística”.

“As instituições públicas continuam a contribuir para a construção de um discurso patrimonial autorizado, e acabam por, não só impedir inovações e reconstruções da cultura local, aprisionando-a, como também limitam os proveitos económicos dos oleiros face a essa patrimonialização ao consumir peças às novas empresas, para uso como lembranças institucionais, e não aos artesãos”, afirmou.

Para Edgar Bernardo, também os artesãos (oleiros) procuram “disputar pelo poder discursivo oficial fechando, sobre si mesmos, toda a legitimidade sobre o que era autêntico na interpretação, narração e produção da olaria e veem a patrimonialização como um processo de e para políticos ao qual estão alheios e não beneficiam diretamente”.

Segundo o investigador, o barro de Bisalhães é atualmente produzido por quatro artesãos de Vila Real e pelas empresas Bisarro Ceramics e Soenga, com produção artesanal, industrial/artesanal e industrial, respetivamente.

Por essa razão, de acordo com Edgar Bernardo, no que respeita à produção e comercialização dos produtos de barro preto, “existe a perceção entre os oleiros e entre alguns agentes locais de que a patrimonialização está a ser capitalizada maioritariamente por novos empresários e produtores que recorrem à marca da UNESCO para vender produtos não tradicionais ou autênticos prejudicando os oleiros e a própria arte”.

“As peças produzidas pelos oleiros estão expostas no posto de turismo, nos museus, em alguns restaurantes e hotéis, sobretudo na cidade de Vila Real, mas estas são vendidas pelos oleiros diretamente ao consumidor/turista, não existindo uma estrutura organizada que encaminhe visitantes de forma sistemática aos postos de venda”, apontou.

Edgar Bernardo disse que a marca UNESCO, na perspetiva e discurso dos oleiros tradicionais, “não trouxe, até à data, nenhuma vantagem direta reconhecida, além do acesso à matéria-prima”.

“Esta perceção negativa do processo surge por entenderem não ter beneficiado como e onde previam, e haviam proposto no plano de salvaguarda feito aquando da candidatura a Património da UNESCO”, afirmou.

Acrescentou que os “representantes das instituições públicas consideram o processo um sucesso, estando satisfeitos com as metas atingidas até à data, ainda que nem todos os objetivos tenham sido ainda atingidos”.

“Independentemente da veracidade da justificação, a perceção dos oleiros e da comunidade é de que o plano de salvaguarda não trouxe, até à data, efetivamente nenhuma alteração que permita potenciar o consumo da olaria por parte de turistas nacionais ou estrangeiros. Mais, esta perceção reforça a ideia de que os oleiros e a aldeia de Bisalhães não foram ou estão a ser escutados e envolvidos no presente e no futuro da olaria”, concluiu.

O trabalho de investigação foi defendido em junho de 2020, na Universidade de Aveiro, e está integrada no "Dourotur", projeto que pretende colmatar o fosso existente entre as potencialidades do Douro e o seu desenvolvimento, maximizando o papel do turismo na estimulação da economia local.

O processo de fabrico do barro negro inclui desde o tratamento inicial que se dá ao barro até à cozedura.

As peças são cozidas em velhinhos fornos abertos na terra, onde são queimadas giestas, caruma, carquejas e abafadas depois com terra escura, a mesma que lhe vai dar a cor negra.

Foto:AP



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