Luis Guerra

Luis Guerra

Viagens no meu País

Os resultados preliminares dos Censos/2021, recentemente divulgados, apontam para um decréscimo da população nacional, no espaço de dez anos, na ordem de 2%, cifrando-se esta atualmente em 10.347.892 indivíduos.

Para esse resultado negativo, os municípios transmontanos deram, infelizmente, um contributo significativo, tendo todos eles registado variações negativas da sua população, mais suaves nos concelhos de Bragança e Vila Real (inferiores a 5%) e mais pronunciadas nos concelhos de Torre de Moncorvo e Alfândega da Fé (superiores a 15%).

Os censos mostram, na prática, que, nos últimos dez anos, não foi possível travar nem inverter o processo de litoralização demográfica, bem como de concentração populacional nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.

Obviamente, estes resultados obrigam a repensar as estratégias de desenvolvimento e as políticas públicas, sob pena de aprofundamento das assimetrias regionais e de ameaça à coesão nacional.

Com efeito, o Estado nacional compõe-se de três elementos: povo, território e organização político-administrativa. Se um desses elementos falha, é a própria sobrevivência do Estado, tal como o conhecemos, que pode vir a ser posta em causa, quer por efeito de uma pulverização quer por absorção, em todo ou em parte, por outro Estado.

A atratividade dos municípios e regiões portugueses depende de vários fatores, desde logo da existência de fontes de trabalho e de rendimento, mas também da qualidade de vida que proporcionam.

Nesse sentido, teria o maior interesse dispor de um índice nacional de desenvolvimento humano que permitisse avaliar, com alguma objetividade, o posicionamento de cada município e região no conjunto nacional, favorecendo o correto diagnóstico das carências existentes e a definição de políticas públicas, nacionais e locais, dirigidas à superação dos fatores que comprometem o desenvolvimento de cada comunidade, à semelhança do que já faz a Organização das Nações Unidas (ONU) com os países membros.

Para tanto, seria necessário dispor de uma fórmula de cálculo que tivesse em conta não apenas o Produto Interno Bruto per capita de cada município, mas também itens como o grau de alfabetização e educação, a esperança média de vida e a taxa de natalidade, entre outros possíveis, nomeadamente de cariz ambiental, bem como a sensação subjetiva de felicidade, da respetiva população.

Essa informação potenciaria também escolhas mais esclarecidas dos cidadãos entre os programas eleitorais submetidos a sufrágio, bem como uma atitude mais exigente relativamente aos impactos das políticas públicas no desenvolvimento local e regional.

Por outro lado, o conhecimento dessa realidade poderia induzir os agentes políticos, económicos e sociais locais a procurar conhecer e seguir as boas práticas de outros municípios com maior índice de desenvolvimento humano.

A titulo de exemplo, alguns municípios transmontanos de média dimensão poderiam inspirar-se na experiência do Fundão, que tem vindo a fomentar a criação de polos de inovação digital com o objetivo de promover novas dinâmicas de inovação e de fomento da transição digital nos territórios do interior.

E, focando-nos ainda na Beira Baixa, região que partilha a condição de interioridade com Trás-os-Montes, não é demais recordar a importância de saber fixar talentos, aprendendo a respeitar e valorizar a diferença pessoal e cultural, a liberdade de consciência e de expressão, bem como a autonomia individual, sem o que os mais capacitados tenderão a partir, por força das circunstâncias ou por pressão externa, privando a respetiva comunidade do seu contributo valioso, como a estátua do célebre Amato Lusitano (Castelo Branco, 1511 — Salonica, 1568) nos obriga a relembrar.

 

Luís Filipe Guerra, Juiz e membro do Centro Mundial de Estudos Humanistas

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