O presidente da União dos Pequenos Agricultores (UPA) de Zamora responsabiliza as autoridades regionais ligadas ao Ambiente pela praga de ratos que assola a província espanhola de Castela e Leão e que acredita estar relacionada com as reservas naturais de aves.

Aurelio Gonzalez não tem «provas para avançar com uma acção contra a junta de Castela e Leão e o Meio Ambiente», mas está convencido de que os ratos foram introduzidos na região espanhola para alimentar as aves protegidas de reservas coincidentes com as zonas a braços há várias semanas com a praga de roedores, próxima da fronteira com Portugal.

«Sempre houve ratos nos campos», nomeadamente o mais familiar, o mediterrânico, mas, segundo garantiu à Lusa, o que está a provocar estes danos, o rato «campesino», «é o pior de todos» e só começou a aparecer em algumas zonas da região há cerca de 15 anos, na mesma altura em que foram criadas várias reservas de aves, desde Palencia até Ávila.

«A junta e o Meio Ambiente foram quem os atraiu ao criar as reservas para aves nestas zonas», afirmou, realçando a coincidência com as áreas afectadas pela praga.

Aurelio está convencido que esta espécie de roedores veio da zona mais a norte dos Pirinéus e Catalunha e foi introduzida em Castela e Leão para alimento das aves de rapina das reservas ou atraída pelos alimentos lançados a outras aves.

O «campesino» é maior que outros ratos, mas mais lento o que o torna numa presa mais fácil.

«Não contavam é que os bichos se reproduzissem tão depressa», observou, principalmente em anos como o actual, com uma Primavera abundante em chuva.

Estudos científicos disponíveis na Internet corroboram esta alucinante capacidade de reprodução, dando conta de que as fêmeas atingem a maturidade sexual com apenas um mês de vida e os machos aos dois meses.

O período de gestação é de 21 a 22 dias e pode resultar entre duas a onze crias.

A população aumenta, quando se dá a explosão demográfica, de cinco a 10 por hectare para 200 por hectares, fenómenos que ocorrem normalmente no início do Verão e prolongam-se por três a cinco meses.

Os cientistas e as autoridades regionais dizem que o fenómeno é cíclico e ocorre de três em três ou de quatro em quatro anos, mas os agricultores garantem que nunca a praga atingiu a actual dimensão.

Tal como nas últimas semanas, também há cerca de nove anos, segundo o dirigente da UPA, a zona de Tierra de Campos foi a mais afectada, mas Aurelio garante nunca ter visto estes roedores próximo de Zamora como agora e cada vez mais em direcção à fronteira.

Tudo começou em Palencia há quase um ano, a 130 quilómetros de Zamora e a mais de duzentos da fronteira com o Nordeste Transmontano.

«O governo não deu importância e agora propagaram-se por todos os sítios», disse o presidente da UPA de Zamora, que denunciou nos últimos dias a aproximação da praga à fronteira com Portugal.

Tanto Aurelio como o dirigente da UPA em Aliste (mais próximo da fronteira), Blas Fernandez Alonso, admitem que nas respectivas regiões a praga não tem a dimensão de «Campos», mas Blas assevera que «só diz que não há ratos próximo da fronteira quem não anda diariamente nos campos».

Este dirigente vive e tem terrenos agrícolas em Nuez, uma localidade junto à fronteira portuguesa de Quintanilha, onde mostrou à Lusa tocas dos roedores.

Disse que segunda-feira vai pedir aos autarcas das povoações vizinhas para solicitarem à junta de Castela e Leão que envie também para esta zona o veneno para exterminar a praga.

Ao contrário do que acontece mais a sul, onde o Douro Internacional é apontado como barreira natural à propagação, Blas não vê nesta zona travão aos roedores.

O rio Maças, que aqui divide os dois países, não tem a força do Douro e só os campos menos cultivados do lado de Bragança poderão desmobilizar os roedores, por falta de alimento.

O ministro do Ambiente, Nunes Correia, garantiu sexta-feira que o governo português está atento ao problema, mas sem necessidade ainda de outras medidas.

Na zona espanhola de São Miguel de la Ribera, 21 quilómetros a sul de Zamora, os ratos só já encontraram praticamente o restolho das searas quando chegaram depois de terem devastado 80 por cento do cereal em Tierra de Campos, segundo estimativas da UPA.

«Aqui (São Miguel) atacaram o que encontraram: girassol, forragem para o gado, açucareira (raiz parecida com o nabo, de onde se extrai o açúcar), frutos», contou.

«Têm boa boca, até pimentos e melões me comeram», ironizou José Gonzalez, pai do dirigente da UPA e também ele agricultor.

A Lusa visitou alguns dos terrenos onde os roedores, segundo contaram os agricultores, são mais activos no final da tarde e à noite.

Dois caçadores que caminhavam nas mesmas terras, Ramiro Mangas e António San Damaso, garantiam ter acabado de calcorrear uma vinha onde vários exemplares lhes cruzaram o caminho, mas a reportagem da Lusa fez o mesmo percurso sem sucesso.

Mais fácil de encontrar é a sucessão de buracos das profundas tocas que os roedores cavam para se resguardaram e de onde partem carreiros de rastos que deixam na movimentação à procura de alimento.

A cevada que é o principal alvo da praga serve agora para ajudar a dizimá-la misturada com um químico, a clorofacinona e cujos resultados são visíveis em alguns cadáveres da praga que se encontram nestes campos.

A junta de Castela e Leão está a distribuir gratuitamente pelos agricultores este produto, junto com tubos.

Aurelio recebeu duas sacas de 900 quilos para distribuir por cerca de 50 agricultores da sua povoação, com 400 habitantes.

Nos campos de São Miguel de la Ribera já estão instalados vários destes tubos cheios de veneno e enterrados, ficando apenas acessíveis os buracos das extremidades para os ratos entrarem e comerem o veneno e evitar que afecte outra fauna.

Outro dos métodos que estão a ser utilizados para combater a praga é a realização de queimadas controladas.

O dirigente da UPA garante que há mais de 620 municípios desta região espanhola afectados pela praga, que já levou à criação de um grupo de trabalho para coordenar estas medidas.

As autoridades regionais já reuniram também um grupo de especialistas para estudarem o assunto.

A junta de Castela e Leão está também a apoiar financeiramente os agricultores, pagando 70 por cento dos montantes dos prejuízos.

De acordo com dados da UPA, só na zona de Zamora foram apresentados 10 mil pedidos de ajuda, mas nem todos serão aceites por falta de comprovativos dos danos.

«As medidas estão a funcionar, estamos a conseguir debelar a população (de ratos) e a expansão está a ser mais lenta do que há dois meses», disse Aurelio Gonzalez.



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