No ano passado, a comercialização de vinho do Porto rendeu 450 milhões de euros, um crescimento de 1,2% face ao ano anterior. Os sinais para 2006 são animadores - os operadores do sector acreditam que a venda das 123 500 pipas de benefício (autorização para a produção do vinho) acordadas para este ano faça subir aquele valor.

Cada pipa vale cerca de mil euros. O vinho do Porto representa hoje perto de 60% do total das exportações de vinhos nacionais e cerca de 20% de todas as exportações da área agro-alimentar. Os principais compradores adquirem, de forma crescente, vinhos mais caros - de 1990 para 2005, registou-se uma subida de 22 milhões no número de garrafas de categoria superior exportadas. O mercado dos outros vinhos produzidos na região duriense ganha maturidade e notoriedade…

A importância económica do vinho do Porto para a região fica demonstrada? Os números são, de facto, esmagadores. Sucede que também são enganadores, na medida em que apenas dão cor à estatística. No Douro, a realidade é bastante mais negra.

O pior

Os números, outra vez a região, que alberga cerca de 35 mil vitivinicultores, tem uma taxa de analfabetismo a rondar os 18%; o índice de poder de compra é quase a terça parte do de Lisboa; entre 1991 e 2001, o Douro perdeu 7,1% da população; o índice de envelhecimento é 30 pontos percentuais superior à média nacional; o Produto Interno Bruto per capita (contributo individual para a riqueza nacional, indicador fundamental para avaliar o grau de desenvolvimento de uma região) é quase 50% inferior à média nacional…

O que explica este paradoxo? A região, que já teve o mais importante produto das trocas económicas do país, antes de a agricultura definhar, vive excessivamente agarrada à produção de vinho do Porto. As consequências para a economia duriense são, na opinião de Bianchi de Aguiar, professor universitário e ex-secretário de Estado do Desenvolvimento Rural, \"uma das mais pertinentes questões\" que se colocam ao futuro da região.

Dependência

\"A aposta noutro tipo de vinhos é já uma tentativa de diversificação, mas é verdade que a região está muitíssimo dependente da viticultura, o que a deixa numa situação vulnerável\", entende o também presidente honorário da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV). \"Há, de resto, outras culturas mediterrânicas que podem servir de complemento, como o azeite ou a amêndoa. Mas o mais importante será, porventura, assumir o turismo como o principal subproduto do Douro\".

\"O vinho do Porto teve um efeito anestesiante para a região do Douro\", assevera, por seu turno, Isabel Marrana, presidente da Associação de Exportadores de Vinho do Porto. \"Nestes 250 anos (de região demarcada), a região adormeceu. Não vejo outra hipótese que não seja a procura de alternativas, sendo que não me parece suficiente a aposta noutros vinhos do Douro\". \"A região não pode viver só do vinho do Porto, porque o vinho não é um mero suporte regional, é, antes de mais, um negócio\", avisa Isabel Marrana.

Para o pequeno vitivinicultor duriense, há ainda outro drama a fatia de leão do rendimento proporcionado pelo vinho do Porto \"é deslocalizada para Vila Nova de Gaia, onde se encontram os grandes exportadores\", assinala Bianchi de Aguiar. \"O valor do trabalho incorporado na região é, de facto, muito baixo. Não chega para os agricultores terem alguma qualidade de vida\", refere. \"A valorização dos outros mostos da região é muito importante, mas a produção de novos vinhos não tem repercussões significativas no pequeno agricultor\".

\"O futuro do Douro não se está a construir\", sintetiza Colaço do Rosário, professor de política agrária na Universidade de Trás-os- -Montes e Alto Douro. Porquê? Porque \"aquilo que se fez com o vinho do Porto não se está a fazer com outros produtos nobres, como a azeitona e a amêndoa, o que trava a diversidade. Se a estas culturas, que podem ter elevada rentabilidade, juntarmos uma aposta no turismo, talvez possamos ter uma economia promissora na região\". A região bem o merece.

O facto de coexistirem vários vinhos de qualidade na Região Demarcada do Douro obrigou à criação de um critério de escolha e partilha dos mostos produzidos na região. Por isso, da totalidade da superfície plantada com vinha, somente 26 000 hectares estão autorizados a produzir vinho do Porto. De resto, a vinha ocupa na região 15,4 % da área total. Os 35 mil viticultores durienses possuem, cada um deles, em média, cerca de um hectare de vinha. São os pequenos produtores que têm um grande peso na produção de vinho do Porto.



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