Ana Soares

Ana Soares

Cantarinhas ao fim-de-semana

A Feira das Cantarinhas, que tradicionalmente se realiza nos dias 2 e 3 de Maio, vai passar a ter lugar no primeiro fim-de-semana de Maio. A decisão da Câmara Municipal de Bragança (CMB) e da Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Bragança (ACISB), anunciada ontem, foi precedida de uma auscultação, realizada, em que se questionava a população em geral quanto à preferência da manutenção da data tradicional da Feira ou a sua passagem para o primeiro fim-de-semana de Maio.

Devo, desde já, dizer que, ainda que seja favorável à manutenção da Feira das Cantarinhas nos dias 2 e 3 de Maio não me choca a possibilidade da sua alteração ou, pelo menos, o seu alargamento (o que, tanto quanto se sabe, não foi equacionado). A verdade é que, se a tradição (em muitas coisas) ainda deve ser o que era, negar a evidência que novos tempos exigem novas perspectivas, nomeadamente sociais e de comunicação para alargar a abrangência de uma Feira como a nossa, seria por demais fantasioso. No entanto, há dois aspectos, um na base da decisão e outro adjuvante à mesma, que me parecem profundamente errados.

Desde logo, o facto de, na apresentação formal da decisão da CMB e da ACISB ter sido reiterado que, conforme consta no site da CMB, a decisão “surge na sequência dos resultados de uma auscultação, junto da população em geral e junto dos próprios feirantes e comerciantes, que votaram, maioritariamente, pela alteração da data de realização da Feira das Cantarinhas.”. Continuando a ler o comunicado, é possível perceber que houve 1.458 respostas ao inquérito para alteração da data, tendo 61% sido a favor. É ainda referido que na sondagem realizada junto dos feirantes, operadores dos terrados e do Mercado Municipal, 85% respondeu favoravelmente à alteração da data.

Ora, se a CMB e a ACISB pretendiam mudar a data da feira mais icónica da nossa Região, podiam (e deviam, na minha opinião) fazê-lo sem se esconderem atrás da peneira da auscultação à população, assumindo as consequências sociais e políticas. Entendo que faria todo o sentido ouvir a população quanto a uma alteração desta envergadura na Feira das Cantarinhas, mas apenas se a mesma fosse feita com sentido da responsabilidade e de acordo com o perfil dos cerca de 35.000 habitantes do nosso Concelho. Escudar-se por detrás de uma auscultação “amplamente divulgada no website do Município de Bragança, nas redes sociais, tendo, ainda, sido disponibilizada em formato papel nas instalações da ACISB, aos comerciantes do centro urbano, aos feirantes, aos operadores do Mercado Municipal, no Balcão Único de Atendimento do Município de Bragança, nas Piscinas Municipais e na Biblioteca Municipal”, como se vê pelos números que a mesma espelha, é lamentável, disparatado e desleal. Está inerente a ter responsabilidades públicas e políticas assumir as decisões que se tomam, as suas motivações e as suas consequências. Lamentavelmente não é o que aconteceu no caso.

Por outro lado, foi referido que a alteração pretende reforçar a atractividade, a captação de visitantes, a dinamização da economia local e a promoção do turismo regional. Sem dúvida alguma que a Feira das Cantarinhas tem subjacentes muitas potencialidades até hoje inexploradas. Mas a verdade é que, depois do (acertado) regresso da Feira à parte central da Cidade, pouco foi feito no sentido de aumentar a dinamização da Feira das Cantarinhas e suas repercussões a nível local. Dizer, sem concretizar (ou pior ainda, como se bastasse por si só) que a alteração da realização da Feira para o fim-de-semana irá ser suficiente para atingir os objectivos que mencionei é, no mínimo, ingenuidade.

Ou seja, e indo directamente ao tal aspecto adjuvante da decisão que referia, parece-me que é inócuo fazer uma apresentação formal da alteração da data da Feira das Cantarinhas e enunciar abstractamente os objectivos da mesma, sem nada concretizar. Será que os percursos dos STUB’s serão alargados esse fim-de-semana, de modo a que as pessoas que residem nas aldeias possam ir com mais facilidade à Cidade? Será que a CMB está a organizar actividades de modo a potenciar a origem medieval da Feira das Cantarinhas? Estaremos perante uma organização que trará novidades à Feira, nomeadamente quanto à animação cultural, que vá para além de um cartaz anualmente esgotado e maçador? Pela nossa Cidade, e como fan da Feira das Cantarinhas, espero sinceramente que sim, que estas e outras potencialidades sejam verdadeiramente aproveitadas. Porque já é tempo que a sorte inerente às Cantarinhas se alargue também ao seu Concelho berço.


Partilhar:

+ Crónicas