Alexandre Parafita, escritor e investigador, disse hoje à Agência Lusa que o que «perdura de mais genuíno das tradições do Entrudo em Trás-os-Montes» são os desfiles de «caretos», «matrafonas» e «facanitos», leituras de «testamentos», «julgamentos públicos» e «pulhas casamenteiras».

Salientou ainda que a tradição dos «caretos», tal como ocorre em Podence, Macedo de Cavaleiros, é a «mais activa» de todas.

Explicou que, nesta festa, os rapazes vestem com os seus fatos de franjas de cores garridas, máscaras de lata e chocalhos à cintura, e percorrem num «frenesim eléctrico» todos os cantos da aldeia, entram e saem pelas janelas das casas e alpendres, trepam aos telhados, em busca das raparigas solteiras que arrastam para a rua ensaiando com elas rituais eróticos.

Estas, acrescentou, caso não queiram entrar neste «jogo» só têm uma solução, que passa por se vestirem de «matrafonas» (mascaradas como eles) e saírem também para a rua, onde estarão imunes às investidas dos moços.

O cortejo completa-se com os «facanitos», ou seja os mais pequenos da aldeia que, mascarados de «rasgos ou mafarricos», acompanham os demais, cumprindo, também eles, o seu próprio ritual de iniciação e garantindo, ao mesmo tempo, a continuidade da tradição.

Entrudo em Santulhão, Vimioso

Para Parafita, singular é também o Entrudo em Santulhão, Vimioso, conhecido como «julgamento do Entrudo», onde se posicionam o «anunciador», o «Entrudo» acompanhado pela mulher e filhos, depois os «advogados» de acusação e defesa e, por fim o «juiz» exibindo o «livro das leis».

«Esta alegorização do Entrudo e do seu clã familiar visa responsabilizá-los pelas desgraças do Inverno, especialmente os males agrários, pelo que o ritual do julgamento representa, simultaneamente, o seu esconjuro e a purificação da comunidade, que assim entrará, com outro ânimo, num novo ciclo produtivo», explicou.

Daí que, acrescentou, lavrada a sentença pelo juiz, os bonecos de palha, simbolizando as figuras a esconjurar, sejam queimados na praça pública perante a azáfama do povo.

O investigador salientou ainda que, estas manifestações, são comuns a outras zonas de Trás-os-Montes e Alto Douro, como acontece com os caretos de Vila Boa de Ousilhão, os caretos aos Pares de Lazarim, os diabos, a morte e a censura em Bragança, a morte e os diabos de Vinhais, as pulhas casamenteiras em Mogadouro, os testamentos ou papeladas em Espinhoso.

Por fim, Alexandre Parafita lamentou que o Ministério da Cultura tenha «inviabilizado» a candidatura deste Património Imaterial à lista da UNESCO, preferindo concentrar, segundo frisou, «os seus esforços na candidatura do fado, contra as próprias normas da UNESCO, pois o fado está muito longe de ser um bem cultural cuja viabilidade corre perigo».



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