Conheci o Museu do Douro quando ainda - ele, o museu - mal gatinhava. Mas já sorria. E como sorria! Um sorriso atrevido. Desafiador. Confesso que me apaixonei pelo sorriso atrevido e desafiador do Museu do Douro. Paixão ao primeiro sorriso!

Pelo Museu do Douro - paixão cega como o são todas as paixões - carreguei livros à chuva em Lamego; pisquei o olho aos quadros do Mestre José Rodrigues em Alfândega da Fé; celebrei a vitória dos homens contra a filoxera em S. João da Pesqueira; calcorreei centenas de quilómetros, depois de um dia de trabalho, a recolher informação que, hoje, é património do museu… Tudo em troca de um sorriso. Um certo sorriso.

Aí pelo apanhar das canas das comemorações dos 250 anos da Região Demarcada do Douro - em que participei (Os Livros e o Douro) como bibliotecário ao serviço da Câmara Municipal de Alijó - dei por mim pensabundo. Recordo-me de que era um fim de tarde de Inverno. Um daqueles fins de tarde de Inverno em que o nevoeiro engole, mansamente, todo o Vale do Douro. E, pensabundo, constatei

- O museu já não sorri.

Engoli aquela constatação como se houvesse engolido um caroço de azeitona. Não um caroço de azeitona. Como se houvesse engolido uma castanha em brasa. Senti um arrepio no estÎmago. Aquele arrepio do fim. Do fim da paixão. Da minha paixão pelo museu.

- Fique bem, senhor museu - estendi-lhe a mão.

Nesse fim de tarde emborrachei-me. Desde a adolescência que sempre celebro o fim de uma paixão com uma borracheira. De vinho. Do Douro.

No dia seguinte acordei com as ideias mais quebradiças do que folhas de videira. Folhas secas pelas geadas de Janeiro. E, quebradiço, vomitei

- Nunca mais me vou apaixonar.

Pouco tempo depois, já o vinho envelhecia de novo em paz dentro das pipas - durante os festejos dos 250 anos da Região Demarcada do Douro o vinho mais turvou do que envelheceu, tal foi a foguetada -, começaram a chegar à minha caixa do correio estórias envinagradas sobre o museu. O Museu do Douro.

Com a paixão ainda a escorrer pelo bico da pena, escrevi uma crónica. Uma crónica apaixonada. Apaixonada e envinagrada. Tão apaixonada e envinagrada como as estórias - tantas estórias! - que, por esses dias, desaguavam na minha caixa do correio. Por vontade de S. Pedro, e só dele, acabei por não publicar a crónica apaixonada e envinagrada que escrevera!

Não conheço, olhos nos olhos, o actual director do Museu do Douro, arquitecto Maia Pinto. Mas, pelo que me informei, sei que ele sabe da poda. Tal como o anterior director, professor Gaspar Martins Pereira, sabia. Contudo, em minha opinião - a opinião de um desapaixonado é o que é -, não basta lavrar, escavar, podar, enxofrar, sulfatar… para que a colheita seja generosa. Também é importante - e quanto! - que o S. Pedro bote a sua bênção sobre a vinha.

- Que o S. Pedro abençoe o Museu do Douro!



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