Tal como acontece com as marcas de detergentes e das pastas dentífricas, a necessidade de mudar de embalagem mantendo o mesmo produto é uma técnica de marketing que também chegou ao futebol português.

No fundo, trata-se de mudar para ficar tudo na mesma. O que é preciso é manter a malta da bola atenta, apaixonada e devota, como se de uma religião se tratasse. O tempo corre mais depressa e as pessoas sentem-se mais \"felizes\" com uma animada conversa ou uma discussãozita sobre a telenovela do Jardel ou nos detalhes de uma espécie de crónica masculina em que se transformaram os jornais desportivos, exímios na exploração de todos os detalhes que rodeiam o mundo da bola.

Esta época, antes mesmo do início da agora chamada Super Liga, o jogo entre o campeão Sporting e o modesto Leixões proporcionou no final um espectáculo imprevisto tendo como actor o treinador/doutor da equipa de Matosinhos que, num adiantado estado de exaltação e descontrolo, afirmou alto e bom som, perante as câmaras da tv do Estado, que estava farto do que de passava no futebol português, considerando-o um autêntico pântano a cheirar mal já há alguns tempos. Na sua opinião, era urgente a mudança. Contudo, este responsável continua e vai continuar em contacto com esse pantanal, presume-se por ser mais rentável do que dar aulas numa qualquer escola deste país.

Depois veio a primeira jornada, mas antes estalou uma guerra, de educados insultos e insinuações entre os presidentes dos dois grandes clubes do Porto, isto a propósito de suposto tráfego de influências e da manipulação dos relatórios da arbitragem feitos pelos delegados aos jogos.

Esta nova Super Liga iniciou-se, por antecipação, fora do campo e num clima de guerra aberta, desta vez não entre o Norte e os \"mouros\", mas entre nortenhos da mesma cidade. O resultado traduziu-se pela derrota do Boavista e do corte de relações com o FC Porto.

Quanto aos resultados da primeira jornada, tudo normal, excepto dois apontamentos com destaque: o primeiro tem a ver com o facto de nada ter mudado em termos de tempo útil dos jogos efectuados, sendo lamentável que a esmagadora maioria não tenha sequer atingido os 50 minutos de jogo vivo.

Só três conseguiram ultrapassar aquela fasquia: Académica/Sporting, Nacional/Gil Vicente e Paços de Ferreira/Varzim.

No jogo das Antas, com o Belenenses, o tempo útil foi de apenas 42 minutos. O resto foi gasto com interrupções (bolas fora, jogadores no chão, cobrança de faltas, reposições de bola em jogo, etc.). Perante isto, os pagantes deveriam multiplicar por dois o montante do bilhete adquirido.

O segundo vai para o triste espectáculo da responsabilidade dos dirigentes de Coimbra que, jogando no estádio da Figueira da Foz, venderam mais bilhetes do que lugares, obrigando algumas pessoas a verem o jogo no café da esquina.

Incidentes deste tipo logo no começo da agora chamada Super Liga, mancharam desde logo a nova embalagem do velho produto.

Perante tudo isto, assume cada vez maior importância a falta de ética nas atitudes dos dirigentes. Uma classe à qual tem faltado classe, condição necessária para credibilizar uma actividade cada vez mais transformada numa indústria que, afinal, vive mergulhada num pântano, como afirmou o treinador do Leixões.

A propósito, parece-me oportuno lembrar a recente entrevista dada ao jornal \"Público\", no domingo passado, por José Veiga, que representa 120 jogadores. Este empresário transmontano, de Carrazeda de Ansiães, responsabiliza a classe de dirigentes pela situação a que chegou o futebol português, afirmando que não devem ser procurados bodes expiatórios porque os grandes culpados são os próprios dirigentes, uma vez que ninguém os obriga a pagar as elevadas quantias que recebem os jogadores.

Veiga diz ainda que são falsas as promessas dos dirigentes quando prometem aos sócios a construção de equipas para o futuro. Para ele trata-se de uma pura ilusão, uma vez que os dirigentes o que pretendem é vender os jogadores. \"Eles próprios é que nos contactam para vender. (...) Qualquer proposta que surja, os clubes são vendedores. Não há alternativa\", afirma José Veiga na referida entrevista.

Se o corte de relações pega, teremos uma Super Liga envenenada de conflitualidades que em nada ajuda ao êxito do Euro 2004.

Cá por mim preferia que fosse decretado um corte nas \"ralações\" entre os senhores da bola. O futebol merecia e o país agradecia.



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