Luis Ferreira

Luis Ferreira

O medo saiu à rua

Depois de tantos acontecimentos horríveis que bafejaram este país de que muitos se orgulham, o melhor era vivermos uns tempos de paz e sossego sem preocupações de maior. O que se passou em Pedrogão e recentemente em Santa Comba Dão e Tondela, deveriam envergonhar-nos durante algum tempo e equacionar soluções para obviar idênticos sucedâneos. Contudo, parece que o governo, tão solícito a esse respeito, está um pouco confuso com as medidas que deve tomar futuramente. A verdade é que depois da reportagem de uma estação de televisão nacional desvendar a possibilidade de haver um Cartel do Fogo que esconde negócios de milhões e onde aparecem indícios de ligação do Estado a esse mesmo cartel, o assunto fica muito mais difícil de deslindar. Aliás não é nada que nós não soubéssemos ou pelo menos não desconfiássemos. Era impensável um fogo começar à meia-noite ou à uma da madrugada! Mas alguém viu caírem do céu, durante a noite, “pára-quedas” de fogo que, pendurados em ramos de árvores tratavam de atear mais um ou dois incêndios. E como as nuvens não trazem fogo desse género, também ouviram os motores dos aviões que passavam e atiravam esses presentes com objetivos bem específicos. A justiça anda de viagem. Possivelmente em algum cruzeiro lá para as bandas das Caraíbas! Deve ser difícil patrulhar os céus especialmente de noite! Francamente!

Infelizmente as coisas não pararam por aqui. As más notícias e o que nos chega a envergonhar tremendamente continuam. Mas não se trata somente de vergonha. O medo começa a espalhar-se por todo o lado e as pessoas receiam andar livremente por onde costumavam andar ou ir a locais que frequentemente serviam para espairecer, esquecendo os desgostos do dia-a-dia e os males do mundo. As recentes notícias divulgadas sobre agressões de jovens à saída de discotecas, sem motivos aparentes que as justificassem, levantaram uma onde de revolta nacional. Na verdade, os vídeos divulgados são de uma atrocidade tão grande que chega a parecer irreal que aconteça semelhante coisa. Mas aconteceu. Agora, a onda de revolta espera que os culpados sejam castigados. Severamente castigados. Mas, serão?

Tudo se complica quando se descobre que são os próprios seguranças que agridem quem lhes apetece, como se se tratasse de um qualquer jogo de vídeo game, onde o objetivo é descarregar toda a fúria no primeiro individuo que aparecer pela frente. Não há motivos. Há somente objetivos.

Perante tanta ineficácia da polícia, o governo viu-se na necessidade de intervir. Finalmente! Resta agora saber se a justiça consegue acompanhar esta vontade intrínseca do executivo e do Presidente da República. Aliás, parece que o motor da decisão saiu da boca de Marcelo que tem estado sempre na linha da frente nos assuntos mais prementes. A opinião do Presidente serve de mote às quadras do governo e a dança desenvolve-se de seguida.

O país viu completamente desagradado toda esta sucessão de notícias escabrosas. Está em pânico. Tem medo. Temos medo. Invisível, ou talvez não, ele está no meio da rua e pode atropelar qualquer um de nós que se cruze no seu caminho. Pior do que isso, é que ninguém está disposto a confessar o crime com medo das represálias veladas dos criminosos. Há vídeos dos crimes, mas ninguém se quer queixar. Há feridos, há quase assassinatos, internamentos em urgências, em cuidados intensivos, jovens em coma, mas não há que apresente depoimentos sérios que levem os criminosos à cadeia. Parece mesmo um jogo. Perde-se, volta-se a tentar desde o princípio até conseguir chegar ao fim. Ao objetivo. Já não bastam as ameaças.

Envolto em manta de medo e desassossego, o país vive sob a ameaça de represálias de indivíduos que, em vez de proteger os incautos, agridem os inocentes. Choram-se a cada esquina os mortos e os feridos. Não é para menos. A justiça não funciona. Se uns não têm medo, outros morrem de medo. Quando o país precisava de descansar do desgaste dos incêndios que assolaram o interior e destruíram vidas e bens, eis que surge, de modo diferente, outro tipo de ameaça, menos visível que o fogo, mas onde até se visionam os criminosos. E depois? Vale o que vale. Não serve de grande coisa. Prendem-se uns e deixam-se outros em liberdade. Os de Lisboa não tiveram tempo de fugir. Os de Coimbra foram de passeio, calmamente até Espanha ou França, visitar a família! São conhecidos, são reincidentes, mas a polícia não se quis meter com eles. Porquê? Por medo. Também eles! Claro. Não há dúvidas. A verdade é que o medo saiu à rua.


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