Aqui há uns tempos atrás, andava para aí grande discussão sobre o serviço público de televisão, e o que isso seria, sem que ninguém, mesmo os mais espertos na matéria, atinasse convenientemente na definição.
Para uns era uma coisa, enquanto que para outros, era uma coisa e mais outra coisa, que tanto poderia ser isto como ser aquilo. E porque torna e porque deixa, até que a discussão morreu substituída por outra já nem sei qual, como é costume neste país de brandos costumes e tumultuosas mas infrutíferas pelejas de palavreados.
Claro que não pretendo eu agora que nem sou da matéria, dizer o que é o tal serviço
público de televisão, ainda saiba perfeitamente reconhecer a sua importância, e tenha bem presente nosso direito a usufruí-lo.
No entanto, não errarei muito, se disser que serviço público de televisão, são por exemplo as reportagens que a TVI tem feito e exibido acerca do modo de vida de muitas e muitas crianças nas serranias esquecidas deste nosso país, de que tanto gostamos apesar dos desgostos que por vezes sentimos.
Através delas, das ditas reportagens, tem sido posto perante os nossos tão indiferentes olhos, a realidade nua e crua de um a país a duas velocidades e a dois tempos. Um país onde há petizes felizmente com acesso e usufruto de tudo o que há de mais moderno e confortável, mas onde há também rapazes e raparigas que um dia vão ser homens e mulheres sem nunca terem sido crianças.
Vale-lhes a enorme capacidade infantil para transformar tudo num “ faz –de- conta”, e para fazer eternizar os sonhos, os tais que vamos perdendo ao mesmo tempo que o tempo toma conta de nós, e nos faz inverter as prioridades.
Gente de palmo e meio, para quem ver o mar é um desejo da largura do oceano, ter uma bola ou uma boneca seria a felicidade quase suprema, e ir até à cidade grande, significa aventura maior que por o pés na lua.
Através daqueles trabalhos jornalísticos, entraram-nos casa adentro crianças lindas, simpáticas e ternurentas que amanhecem já a guardar gado, que desfiam as horas do dia na escola depois de uma longa viagem, que não anoitecem sem deitar o olho aos rebanhos, e que pernoitam à pressa, porque ao outro dia também é dia.
Se por acaso alguém ligar começar a ver uma daquelas peças jornalísticas quando ela já se iniciou, o mais certo é julgar estar a ver uma realidade lá daquelas bandas longínquas e para nós atrasadas do centro da Europa, num daqueles países com nomes que temos como muito esquisitos, e indicadores de coisa do outro mundo, que já não nos são próprias.
Tudo isto, num país que é um nico em termos de território, e em regiões a meia dúzia de passos, a modos de dizer, dos grandes centros urbanos onde as luzes brilham, e onde as condições de vida permitem um quotidiano em tudo diferente, ainda que por vezes nem sempre que se recomende.
Por causa das ditas reportagens, algumas daquelas crianças já concretizaram alguns dos seus sonhos, e emocionaram milhões de pessoas como eu e como você, para quem o romantismo da cena não faz esquecer as agruras daquela existência, ao jeito de épocas que já lá vão.
Através das imagens que nos entraram casa adentro pela caixa mágica, podemos mais uma vez constatar a ilusão da nossa modernidade, e a injustiça no modo como Portugal se vem desenvolvendo.
Podemos então concluir que não é necessário ir a doutor em Coimbra, para sabermos que serviço público de televisão é isto, e muitas outras coisas que podem não render o que alguns desejam, mas são o que muitos gostam e querem ver.
Serviço público de televisão

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