No passado dia 1 de Maio, o cabeça de lista nas eleições europeias pelo Partido Socialista, Vital Moreira, decidiu ir até junto dos que se preparavam para participar no tradicional desfile do Dia do Trabalhador promovido pela Intersindical em Lisboa. Quando deu por si o senhor, estava a ser insultado e a levar uns valentes empurrões, por parte de alguns que com a sua presença se incomodaram.
Neste ponto, para contextualização e para lembrança, há que fazer notar, que em anos idos, Vital Moreira foi um conhecido militante do Partido Comunista Português, de quem se afastou por discordâncias ideológicas e por ter deixado se calhar de acreditar em amanhãs que cantam, digo eu, uma vez que assistiu como todos nós, ao desmoronar de um império que se supunha eterno, mas que afinal se revelou tão efémero como castelo de papel colocado com saliva.
Caiu a estrutura política suportada por uma ideologia que nunca foi respeitada nem seguida pelos respectivos oligarcas, enquanto se verifica afinal, que os seus pressupostos porque impraticáveis unicamente levaram a situações mais injustas do que aquelas que se criticam e combatiam. Ruiu o muro, nasceu o desencanto, e muitos abandonaram a ortodoxia ideológica. Eventualmente continuarão a acreditar nas doutrinas enquanto campo filosófico, mas passaram a defender outras práticas políticas.
Com razão ou sem ela, estão no seu direito, e a democracia mais não tem que lhes reconhecer e aceitar as suas atitudes. Ninguém corta a raiz ao pensamento lá diz a cantiga, mas não é isso pelo menos ao que parece, que certos militantes são capazes de compreender, mesmo que passem a vida a fazer juras do contrário. Não conseguem, e como prova dessa impossibilidade, ficaram-nos as tristes imagens da principal manifestação operária deste ano, enxovalhada no seu ponto de partida pela agressão a um conceituado candidato eleitoral. Incompreensivelmente, vimo-lo a ser vilipendiado, agredido, e bem agredido, caso não se tivesse posto a pau.
Os que se dizem admiradores e seguidores de quem lutou e luta para que toda a gente se possa expressar seguindo livremente os ditames do seu modo de pensar, foram ali naquele local e naquela hora, um exemplo acabado e perfeito de quem corta semelhantes e inalienáveis direitos. Bateram em quem em dado momento do seu percurso de vida, decidiu mudar as agulhas na via da sua acção política. Dizem que o agredido se vendeu por um prato de lentilhas ou até de caviar que seja, mas quem julgue sem as amarras do fanatismo logo vê que não.
Não defendo e nem tenho que defender Vital Moreira, mas não posso deixar de concluir assim mediante a sua craveira intelectual de professor universitário com provas mais que dadas. Qualquer coisa que ele ganhe na política, suponho eu, será sempre menos do que aquilo que ele ganharia a ministrar as suas aulas ou a dar os seus pareceres jurídicos. Acuse-se pois o senhor de tudo, menos de cata-vento movido por interesses pequenos.
Mas não se ficaram por isto as cenas tristes. Os pedidos de desculpa devidos pelo líder da Central Sindical mais não fosse na sua qualidade de anfitrião, tiveram de ser arrancados a ferros, e os do líder do PCP, o aguerrido Jerónimo de Sousa, ainda se não ouviram pelo menos até ao nascer destas linhas escritas. Só nos faltou mesmo ver o seu bater de palmas enquanto se diz que só se perderam as que caíram no chão e os pontapés que ficaram que ficaram por acertar. É triste e totalmente esclarecedor de uma falta de respeito democrático num dia em que o cheiro a cravos ainda andava no ar.
Entende-se também por aqui, a razão de a política que devia ser a mais nobre arte, se afigurar cada vez mais como algo impróprio e nada atractivo para quem já tenha provas dadas noutras actividades cívicas ou profissionais. Num abrir e fechar de olhos, qualquer cidadão respeitável passa a ser tratado como o pior dos facínoras, e num repente vê-se sujeito ao que há de pior por parte de turbas ululantes com espuma de raiva ao canto da boca.
Não está certo. Por estas e por outras, é que a falta e de ideias e de atitudes condignas na política estava a fazer crescer o deserto no território do nosso descontentamento.