A Primavera está radiosa neste ano da graça de 2009, pelo menos até agora, e os barcos de turismo já começam a sulcar as águas do rio Douro, tão perigosamente maroto às vezes na invernia, mas tão plácido nestes dias de sol depois de um Inverno que não foi para brincadeiras, conforme atestam uns fiapos de neves pintalgados na serra do Marão.
Noutras alturas, todos no Douro olhavam para os barcos carregados de turistas, e viam neles a esperança renascida em dias melhores advindos do valor acrescentado que por esta via nos chegaria. Com hossanas olhava-se para os que aportavam nos cais fluviais como se eles fossem os cachos a colher na tal vindima permanente em que o turismo regional se ia tornar.
O problema, é que pouco mais se fez para além das loas que se clamaram, poucos se organizaram para receber a colheita e, muitos menos ainda se organizaram para exigir os modos mais convenientes para que no sector se operasse. Isto pelo menos no que aos interesses da região em si próprias toca, que os outros, bem sabem o que fazem e o que lhes interessa quem neles tem acção e comando.
A esperança qual flor de estufa em terra seca, não tardou a murchar. Hoje, para os milhares que vêm pelo rio até ao vale do Douro Vinhateiro, olha-se já com algum desdém e até com alguma má vontade. Viajam enjaulados nas embarcações, muitos já fartos de tanta água e de tanto monte quando colocam pé em solo duriense, e vão-se de seguida de regresso em autocarros vistosos, ou em comboios pouco mais que ronceiros e a lembrar os tempos de há quarenta anos.
Não há Encontro sobre turismo onde se vá, em que não se ouçam remoques contra os malvados operadores fluviais que servem ao que se diz, água de lavar pipas e comida assim a assim, em vez de vinho do bom e do nosso, e de pratos da rica gastronomia que é de cá e nos orgulha além de nos consolar para mal dos nossos pecados, pois pelos vistos o da gula é dos mais graves na escala da gravidade que dá direito a ida para junto do mafarrico. Isto para além de organizarem as viagens de uma forma em que os seus clientes e nossos visitantes nem de nós ficam a saber.
Também, convenhamos nos entanto, que pelo que se aprecia ali no cais, pouco nos adiantaria se fosse de outra maneira. Pela aragem, bem se nota que grosso modo a maioria dos viajantes, vem mais assim tipo excursão de garrafão e merendeiro, do que necessariamente em passeio turístico como é suposto, e daí as expectativas acerca do negócio que chegou a pensar que seria feito.
Muito perto de duzentos mil, vão e vêm, mas de pouco nos adiantam. O caminho é livre, pode por ele vir quem quiser, mas ao menos que deitem o lixo em sacos de plástico e o entreguem no barco respectivo, que disso temos nós cá muito. O negócio das embarcações deve ser de forte concorrência, pois há muitos a desenvolvê-lo. Isso obriga a baixar na tabela de preços, e logo no potencial gastador do cliente. Quem adere, aproveita, conta os tostões e gasta o que se recomenda através do bom senso à medida de cada um. Nada contra, pois estão no seu direito. O que não se deve, é quer particular quer institucionalmente olhar para as centenas de milhar de passeantes como manancial turístico.
O rio é de todos, quem circula não faz sombra ainda que faça lixo, e os operadores desenvolvem a actividade como lhes convém. Quanto a nós, não podemos é continuar passivamente à espera que chova. Por vezes só falta exigirmos uma lei que obrigue os turistas a ficar mais por cá a gastar o seu rico dinheirinho, pois também os há com muito dele no bolso. Esquecemo-nos, é que para isso temos de ir junto deles com coisas de arregalar o olho e de lhes acabar com as horas de monotonia em que só vêm a barriga dos pássaros a passar.
Parece felizmente que algo começa a mudar no entanto. Há financiamentos, há projectos, há quem queira alterar o estado das coisas. Haja inteligência e haja vontade a sério para aproveitar as oportunidades de uma vez por todas. É o que urge para que pelo antigo rio de mau navegar, chegue finalmente nova gente que faça o turismo fluvial ser mesmo feito com quem aprecia aquilo ao que vem ao sair dos barcos a subir e a descer neste rio que corre para o mar.