Chrys Chrystello

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Joel Neto tem razão: a vida no campo é maravilhosa

Crónica 268 Joel Neto tem razão:  a vida no campo é maravilhosa, 25.6.2019

Ando há muito para escrever isto, mas acanhei-me com temor de poder ser mal interpretado ou de poderem daí advir consequências indesejadas. Mas, de facto, viver no campo é uma maravilha, estou aqui na calma bucólica e rural da Lomba da Maia e, por vezes, sinto que voltei atrás no tempo à infância transmontana.

O que mais me impressiona (e daí fazer-me lembrar a infância e  adolescência ) é este sentimento de viver no faroeste sem xerife nem regedor, quando olho ao redor e reparo a quantidade de casas que – nestes quinze anos – foram demolidas, aumentadas, modificadas, recicladas, modernizadas sem que os fiscais da Câmara Municipal da Ribeira Grande se dessem ao trabalho de verificar que tais obras, decorrem, invariavelmente, sem a aposição da longa nota explicativa e indicadora do licenciamento da obra.

 São, decerto, uns serviços de fiscalização compreensivos pois sabem que a situação da pecuária e da agricultura por estas bandas não é das mais famosas, e assim evitam impor coimas nem querem obrigar a demolições (estou a lembrar-me da atual (2000?) promessa de demolição do Prédio Coutinho em Viana do Castelo) aos pobres donos dessas moradias que sem projeto, nem arquiteto, nem construtor civil encartado continuam a pontilhar a paisagem rural da costa norte de São Miguel, tornando-a visualmente mais variada.

Algumas dessas obras, verdade seja dita, ferem a sensibilidade arquitetónica que parece inexistir por estas bandas, umas serão meros mamarrachos, outras são verdadeiros abortos de construção muito pouco civil, contrariando as leis da gravidade ou do bom senso, que também não parece abundar por estes lados. Há ainda aquelas que são feitas à total revelia de tudo, umas mais disfarçadas que outras nas traseiras ou ao lado de edificações anteriores ou no topo de edifícios já existentes.

E é disto que gosto, deste sentimento de impunidade, de fora da lei que parece ser característica comum aos homens da costa norte que mostram, com a sua abstenção maciça nas eleições europeias, estarem verdadeiramente nas tintas para as normas e regulamentos que a EU cria e só servem para empatar a vida destes pacatos concidadãos. E como não votam neles também não se dão ao trabalho de os notificar para essas obras e longe vá o agouro, se eu quisesse comunicar o facto às entidades competentes tinha de tirar um mestrado em burocracia para reportar o sucedido. Só é chato e incoerente depois andarem a pedir subsídios….

Outras das razões por que tanto me apraz viver no campo é ver como aqui parece que não é preciso ter carta de condução (para carros, tratores, ou outras viaturas), nem é preciso levar os carros à inspeção, nem pagar seguro obrigatório contra terceiros, ou usar capacete a andar em veículos de duas rodas, motorizadas ou não… assim se constrói a felicidade  deste povo de gostos simples e sem grandes exigências ao poder instituído  e raras vezes surgem por estas bandas PSP ou GNR a verificar documentação ou outras chinesices que ocorrem nas grandes cidades.

E é este sentimento de total alheamento de leis, normas e regulamentos que me faz gostar de aqui viver e de me sentir tão longe do poder centralista. Joel Neto tem razão é bom viver no campo.

Para o Diário dos Açores (desde 2018), Diário de Trás-os-Montes (desde 2005) e Tribuna das Ilhas (desde 2019)

Chrys Chrystello, Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713 [MEEA/AJA, Australian Journalists' Association] CP AU3804]


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