Chrys Chrystello

Chrys Chrystello

Este povo que hoje não vota 

Crónica 346 este povo que hoje não vota 

Dizia-me pessoa amiga, vais ver que quando menos se espera entra um maluco por um parlamento adentro com uma AK-47 - das que se vendem em qualquer esquina - desata aos tiros e depois suicida-se ou vai viver à nossa custa o resto da vida ….

Ingenuamente inquiri, só uma? Pensei que era metade da população. Mas devem andar todos anestesiados e passivos com o excesso de flúor na água potável e se não se precaverem vai acontecer como em tantos outros países.

Aqui nem o PS nem o PSD se deram conta (na sua sofreguidão de manter o poleiro a qualquer custo) de que a sua sobranceria para com o povo, a sua displicência, promessas incumpridas e repetidas (nos últimos 4 anos não conseguimos mas agora é que vai ser…) é a principal causa do surgimento de franjas do eleitorado tão descontentes que votam em líderes tipo Trump, Bolsonaro, Orban e agora outro do género na Polónia (Andrzej Duda).

Como concordo, citarei agora Zack Magiezi:

“Causa mortis: traumatismo craniano. Fruto de mergulho profundo em pessoas rasas.”

Seria esta a mensagem lapidar para o povo deste país que, apesar da educação se ter massificado, continua generalizadamente ignorante, inculto e abúlico como Eça de Queirós o definia há mais de cem anos:

 Acabava de entrar o ano de 1872. O ano novo interrogava o ano velho.

- Fale-me agora do povo; pedia o ano novo.

- É um boi que em Portugál se julga um animal muito livre porque não o montam na anca e o desgraçado não se lembra da canga; respondeu o ano velho.

- Mas esse povo nunca se revolta? Insistia o ano novo espantado.

- O povo às vezes tem-se revoltado por conta alheia. Mas por conta própria, nunca; respondia o velho.

- Em resumo, qual é a sua opinião sobre Portugal?

- Um país normalmente corrompido, em que aqueles mesmos que sofrem não se indignam por sofrer.

 

 Este diálogo de Eça de Queiróz, o mesmo que escreveu sobre o Portugal de então: “O povo paga e reza. Paga para ter ministros que não governam, deputados que não legislam (…) e padres que rezam contra ele. (…) Pagam tudo, pagam para tudo. E como recompensa dão-lhe uma farsa.” Estávamos em 1872. Estamos a falar evidentemente do bom povo português. A “raça abjeta” congenitamente incapaz de que falava (esse eterno frustrado) Oliveira Martins e que bem poderia ter tutorado este meu escrito:

Um povo cretinizado, obtuso, que se arrasta subjugado, sem lamúrias, a não ser à mesa do café enquanto vê o futebol pois a crise não lhe permite ter TV Sport em casa, sem um lamento, sem um gesto de rebeldia, tão pouco de raiva, nem que seja surda e muito menos de revolta. Um povo que se deixa levar, indiferente e passivo, por políticos sem escrúpulos, mentirosos congenitamente compulsivos, e por múmias silentes, em estado adiantado de decomposição mental, rodeadas de pompa e circunstância e dezenas de servis conselheiros pagos a preço de outro para bajularem. Afinal, a solução dos problemas poderia ser bem simples, a desobediência civil que deitaria abaixo esses castelos de cartas nas nuvens. Os pobres (de espírito) alinhavam sempre com os que pareciam ter o poder e assim os legitimavam. Sempre comeram e calaram, gratos pelas migalhas que os senhores jogavam pelas seteiras do castelo quando a turba suplicava por migalhas para enganar a fome.

Este povo inventou a padeira de Aljubarrota, a Maria da Fonte, a Velha da Ladeira (guerras liberais, São Miguel, Açores) e outras figuras lendárias para escamotear o facto de se tratar de uma populaça perenemente amodorrada e crassa, capaz de aceitar todos os sacrifícios. Basta atentar na lenda das tripas na defesa de Portucale. Povo de chapéu na mão, espinha dobrada até beijar o chão dos senhores feudais, que sempre o espoliaram, antes de recuarem, gratos e venerandos pelas migalhas, bendizendo a generosidade dos  donos.

 Eu vivo nesse país, nesse “sítio” de que falava Eça, nessa “piolheira” a que el-rei D. Carlos se referia (um país de bananas governado por sacanas), também fui governado por gente como o douto Conde de Abranhos “Eu, que sou o governo, fraco, mas hábil, dou aparentemente a soberania ao povo. Mas como a falta de educação o mantém na imbecilidade e o adormecimento da consciência o amolece na indiferença, faço-o exercer essa soberania em meu proveito …” Ontem como hoje. O verdadeiro esplendor de Portugal.


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