És história de muitas conquistas,
na guerra, na paz,
no desfrute, na tristeza,
na opressão, na liberdade,
acima de tudo, ó Língua Portuguesa,
és o canto maior de uma raça,
de homens e mulheres
que ampliaram fronteiras.”

Wanderlino Arruda, poeta mineiro, em “Língua Portuguesa”

Dias atrás, fui ao Museu da Língua Portuguesa, na cidade de São Paulo, visitar a exposição “Gilberto Freyre - Intérprete do Brasil”. Depois, aproveitei para curtir cada detalhe do acervo permanente. Repleto de recursos audiovisuais, nos envolve como se estivéssemos numa verdadeira “viagem” pela construção do nosso idioma. A união das duas mostras me deixou uma mensagem muito clara: a maior riqueza do Brasil sempre foi a diversidade, do povo à própria língua.

A visita também me fez lembrar de outro tema que está “dando o que falar”: o polêmico “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa”. Com a meta de tornar o idioma mais uniforme nos cinco continentes, o tratado começou a ser criado em 1990. Deveria ser adotado pelos oito países da CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (além do território de Macau, na China) ainda este ano. Mas isso está cada vez mais longe de acontecer...

Para se adequar às novas regras, o Brasil precisaria alterar cerca de 0,5% do seu vocabulário. Nos demais países a mudança seria de 1,6%. Desconheço os critérios adotados, mas acho que a «carga» ficou muito mal dividida. As críticas vieram pesadas e, em Portugal, até abaixo-assinados já foram organizados. A Ministra da Cultura contornou a crise pedindo 10 anos para o país se adaptar. Pelo que conheço dos portugueses, é uma forma educada de dizer «Não».

Imagino a polêmica que o Acordo criou em Portugal. Quando estava por lá, o “mundo caiu” quando o Prof. Carlos Reis (Catedrático de Letras da Universidade de Coimbra) declarou que “O futuro da Língua Portuguesa é aquele que o Brasil quiser. Os brasileiros é que vão decidir o destino que querem dar à língua-mãe, por que o Brasil é o único país da CPLP que tem força e peso político no mundo”. Ou seja, o “irmão maior” decide e os outros acatam...

Diante de tamanha controvérsia, foi pesquisar um pouco mais sobre o tema. Descobri um detalhe fantástico: desde 1924 que Brasil e Portugal tentam firmar um acordo ortográfico. Nunca conseguiram! Nem mesmo durante as ditaduras, quando duas assinaturas bastariam para oficializá-lo. Já imaginou agora, que o tratado precisará ser aprovado por oito governos (sem contar a China), todos muito mais preocupados em resolver seus problemas e prioridades internas?

Sinceramente, eu acho que a integração lusófona que muitos de nós sonhamos e nos empenhamos em construir não precisará destes “velhos acordos” para prosperar, muito pelo contrário. Acredito que “novos descobrimentos” serão muito mais úteis. Precisamos nos redescobrir, integrar mais as nossas culturas, apreciar a diversidade e a riqueza de criar juntos, mesclando sotaques, sabores, estilos e idéias. Assim vamos fazer a aproximação que realmente interessa.

Quer um exemplo? Quantos escritores, poetas ou músicos de outros países lusófonos você conhece? Agora tire os “clássicos” (Camões, Pessoa, Saramago, Amália, Cesária, etc). Sobraram quantos? Sobrou algum? Pois então. Neste contexto, de que adianta a nossa ortografia ser mais ou menos diferente? Se essa fosse realmente a grande barreira, José Saramago não teria 25 livros “lusos” publicados no Brasil e Paulo Coelho não seria um grande sucesso em Portugal...

Acredito que as iniciativas realizadas por ONGs como a Etnia (responsável pelas “Casas da Lusofonia”, “Festival Na Ponta da Língua”, entre outros projetos), editoras como a Língua Geral (com sócios de Angola, Brasil e Portugal) ou Editora da UFMG (que fez o lançamento mundial do novo livro do cineasta português Manoel de Oliveira) e até pela Rede Globo (com as viagens do Zeca Camargo e Regina Casé pelos países lusófonos) são muito mais valiosas que qualquer “Acordo Ortográfico”, além de não conterem qualquer “contra-indicação”, como toques imperialistas ou xenófobos.

Como disse Fernando Pessoa, “A minha pátria é a Língua Portuguesa”. Acho que chegou a hora de usarmos melhor esse maravilhoso “passaporte”, válido de uma ponta a outra do mundo, para criar um acordo “de verdade”. Sem políticos, regras discutíveis e decisões de cúpula. Uma união de milhões de pessoas comuns, como eu e você, apenas com uma grande vontade de ir além... mar



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«Foi uma surpresa agradável»

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