Mas talvez pelo facto dos touros de morte que os mexicanos herdaram dos espanhóis serem demasiado violentos para a sensibilidade da Sociedade Protectora dos Animais americana, os a festa brava acabou por entrar no país graças à aficcion dos açorianos e na sua versão portuguesa, sem sangue e com mais protecção ao touro do que ao toureiro.
Todos nós sabemos isso, os portugueses e luso-descendentes que se interessam pelo espectáculo de touros ou simplesmente pelas nossas tradições, mas os
americanos, particularmente os leitores do “New York Times”, só agora começaram a saber.
Na edição de 27 de Junho findo, o influente diário publicou na primeira página desenvolvida reportagem de Patricia Leigh Brown intitulada “In California Bullfights, the Final Deed Is Done With Velcro”, ilustrada com a
fotografia de uma lide de Dennis Borba, apresentado como único matador de touros presentemente em actividade nos EUA.
A temporada taurina californiana prolonga-se de Maio a Outubro, mas atinge o ponto em Junho, com a chegada do intenso ciclo festivo do Espírito Santo, que
mobiliza 350.000 açorianos radicados na Califórnia. São donos ou empregados dos ranchos e explorações pecuárias, ou trabalham nas fábricas e na
construção e dão uma animação especial à região com as suas festas, que incluem quase sempre uma ou mais touradas.
As corridas são habitualmente segunda-feira à noite, depois das missas e das procissões e, conforme referiu Elmano Costa, director do Centro de Estudos
Portugueses na California State University Stanislaus, “são mais do que um espectáculo, são um acontecimento social, o lugar onde os rapazes conhecem as raparigas e se revêm pessoas que só voltam a encontrar-se na tourada do próximo ano”.
Há oito praças de touros na Califórnia, a maioria de ganadeiros como Frank Borba, 74 anos, pai de Dennis e pioneiro das corridas à portuguesa na Califórnia.
João Borba foi ganadeiro na Terceira, o filho seguiu a tradição em escalon e construiu, em 1980, uma praça de 1.200 lugares, Campo Bravo, onde se apresentam regularmente muitos toureiros vindos de Portugal ou do México.
Dennis Borba trabalha no rancho da família, mas desenvolve a sua carreira.
Foi oito anos novilheiro no México, tomou alternativa de matador em 1987 e durante o inverno, costuma tourear no México, Costa Rica, Panamá e Peru.
Quando precisa de um toureiro, Hollywood recorre aos servicos de Dennis.
A jornalista do “New York Times” lembra que, em 1957, a Califórnia aprovou leis banindo touradas, mas a persistência de aficcionados de Gustine, onde
foi construida a primeira praça, conseguiu que fossem autorizadas touradas à portuguesa, sem a morte do touro e sem sangue. Como tal, além das hastes emboladas, os touros têm também uma almofada de Velcro aderente no cachaço, onde o toureiro enfia as bandarilhas sem ferir o animal.
Antigo toureiro e antigo professor de espanhol na Universidade de Maryland, Mario Carrión disse o jornal novaiorquino que Velcro foi uma “adição
esperta”, uma vez que salvaguarda a arte da lide.
“Com ou sem Velcro”, remata Patricia Leigh Brown, “o matador Borba continua a rezar cada vez que entra na arena.
“Penso que é melhor o toureiro ser religoso”, diz Borba. “Na arena, é apenas ele, o touro e Deus”.



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