Viticultor em Vila Real, Fernando Borges fala de um ano de incertezas no Douro e da necessidade de fazer vários tratamentos na vinha para a uva chegar à vindima, mas sem a garantia de que vai ser vendida.

O agricultor disse hoje à agência Lusa que há também uma pandemia que chegou à vinha, onde, nesta primavera, o estado vegetativo está adiantado entre duas a três semanas.

A instabilidade meteorológica que se verifica no Douro, com dias de chuva e frio intercalados com calor, está a obrigar “a uma atenção redobrada” com as videiras e à realização de vários tratamentos fitossanitários para travar doenças como o míldio, oídio e podridão negra ('black rot').

“Este é um ano para esquecer. Muita apreensão e muitos tratamentos”, afirmou à agência Lusa Fernando Borges, agricultor de Guiães, concelho de Vila Real.

Depois de já ter feito quatro tratamentos, o viticultor regressa hoje à vinha para pulverizar pela quinta vez. Em cada aplicação nos seus 20 hectares contabiliza um gasto de “cerca de 1.200 euros” em produtos como o sulfate e um anti oídio.

“Está a ser um ano muitíssimo complicado. Vamos ter que fazer muitos mais tratamentos, os produtos estão mais caros em relação aos outros anos, acho que também há aqui um pouco de aproveitamento das pessoas que o vendem”, referiu.

O viticultor contou ainda que está a fazer tratamentos “cerca de 10 em 10 dias para conseguir manter a vinha sã”, o que tem conseguido até ao momento, e perspetiva que, este ano, tenha que fazer “no mínimo entre oito a nove tratamentos”.

O míldio da videira é um fungo que pode infetar todos os órgãos verdes da planta – folhas, cachos e pâmpanos. A podridão negra é uma doença que provoca manchas escuras e causa estragos nas folhas, pâmpanos e cachos.

Por sua vez, o ataque do oídio provoca a paragem do crescimento da pele dos bagos, que acabam por fendilhar, deixando as grainhas a descoberto.

Fernando Borges frisou que este é “um investimento que tem que ser feito para levar a uva até à vindima”.

“Se queremos obter uma boa matéria-prima temos que fazer tratamentos, embora também não saibamos se vamos vender as uvas, a quem ou a que preço”, salientou.

É que, a acrescentar a esta preocupação fitossanitária, estão também as quebras nas vendas de vinho provocadas pela covid-19 e, se não houver escoamento de 'stocks', os viticultores temem que se pode vir a verificar uma diminuição da procura de uvas e redução dos preços na próxima vindima.

“Falam em 250 euros a pipa de vinho de consumo. No ano passado pagaram 500 euros a pipa de vinho (550 litros cada)”, salientou.

Mas, antes da vindima, as atenções estarão centradas no benefício, fixado pelo conselho interprofissional do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP), e a cada dia que passa aumentam os receios de uma redução que se teme que possa atingir os “20 ou 30%”.

O benefício é a quantidade de mosto que cada viticultor pode destinar à produção de vinho do Porto e representa uma importante fonte de receita para os durienses.

Em 2019, foram beneficiadas 108.000 de pipas (550 litros cada) de mosto, menos 8.000 do que no ano anterior.

“Eu tenho cerca de 47 pipas de vinho do Porto. Com um rombo de 30% no benefício fico com menos oito a nove pipas que são oito a nove mil euros”, exemplificou.

E, afirmou, se se concretizar esta redução pondera “pôr tudo à venda”. “Nem olho para trás”, garantiu.

Fernando Borges defendeu que “é preciso olhar mais para a situação dos agricultores” e considerou que as “ajudas disponibilizadas” pelo Ministério da Agricultura até ao momento não chegam “cá em baixo, aos pequenos e médios produtores” e “vai tudo para os exportadores”.

“A nós, nada, e somos a base da exportação. Se nós não tivermos uma boa matéria-prima, boas uvas, eles não podem vender um bom vinho”, afirmou.



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