Se palavras bonitas e passagens na mão pelo pêlo a bem dizer as nossas paisagens, a nossa acção e as nossas potencialidades enchessem barriga, ou fizessem surgir obra, nós aqui por este Doiro de Deus, andávamos mais pançudos que gado em lameiro farto, e tínhamos par aí obra até alma do diabo, que necessidade dela é coisa que não falta.
No entanto, como nas coisas da política que é o que decide o que se faz ou não se faz neste nosso coitado país, pouco ou nada valemos, por mor das poucas cruzinhas que se contam nas urnas de votos, estamos para aqui mais esquecidos que indesejado depois de morto, e tirando uma ou outra coisita mais não fazemos do que andar a ver os navios, que sulcam as águas do rio
carregados de turistas assombrados com a natureza das coisas, seja a da paisagem, seja a nossa que nos leva à indiferença e à inacção.
Claro que não é por falta de planos elaborados e de estudos do mais completo que há sobre o que nos mingua que se não passa das palavras aos actos, pois feliz ou infelizmente, diagnósticos por certo pagos a peso de ouro, e receitas para todos os gostos e feitios, abundam para aí sempre mostrados com toda a pompa e circunstância, embrulhadas em promessas de que agora é que vai ser.
Era mais ou menos isto que estava para suceder aqui há dias, numa radiosa tarde de sábado ali no auditório no Solar do Vinho do Porto na cidade da Régua, não fosse um redemoinho que se levantou quando a cerimónia se estava para dar como terminada, indicando tudo que um documento laboriosamente elaborado com muito saber, e com muita boa vontade, parecia condenado ao limbo do esquecimento, embrulhado em papel de muito boas intenções, como é costume e nosso gosto.
Por mim, nunca vi aquela sala assim tão repleta de variada e competente gente, e também nunca vi, nestas bandas onde campeia a indiferença, os cidadãos tomarem assim em mãos um assunto que é de todos, e levarem num verdadeiro gesto de cidadania a que algo que parecia inconsequente, virar em algo de palpável e concreto, venham-se a obter os resultados que se vierem a obter.
Aos argumentos que procuravam adiar a resolução da ida a Lisboa dar conta do Manifesto pelo Douro que ali se apresentou, exibidos muito em parte por incómodo político, pelo menos ao que se me afigurou, a plateia de imediato respondeu democraticamente mandatando os que entendeu como mais indicados para semelhante encargo, que se conclui dever ser o mis imediato que possível for, aos mesmo tempo que se vai procurar alargar as bases de apoio ao documento por toda a região.
O documento em causa, o tal Manifesto, que diz que o Douro não pode esperar mais, nasceu por ideia de pessoas de todo o mérito e respeito e com provas dadas, também a nosso modo, foi logo rotulado disto e daquilo, não sei se com justiça ou falta dela, no entanto, seja como for, já valeu a pena. Por um lado, porque é mais um e está bem feito se não der em nada, mas por outro lado, e acima de tudo, porque levou a que desta vez a sociedade civil reagisse, tendo demonstrado que se calhar por vezes é necessário que nem tudo passe pela política, e nem sempre a política passe por tudo, principalmente quando ela se encolhe por reacção, que por vezes é como sabemos inimiga da acção.
Conforme refere o Manifesto, estamos fartos de estudos e de palavreado por parte de quem de longe se digna de oras em quando deitar-nos o olho de soslaio. Pode ser que sirva ao menos, para verem que pelo Douro existe ainda muita gente que sabe com quantos paus se faz uma canoa, e que tem vontade para a fazer rumar em direcção ao que é de direito.
Fazendo paralelo com um outro muito celebre de há muitos anos da época em que era proibido ansiar para além dos limites estabelecidos por S. Bento, sobre este apetece dizer :
VIVA O MANIFESTO, MORRA A INACÇÃO. PUM !