Manuel Igreja

Manuel Igreja

Um país de exclusão

Portugal é decididamente um país de exclusão. Varrido por ciclópicos ventos formados na depressão formada no oceano imenso da dívida insana mas para alguns coniventemente contraída, abana por todo o lado e deixa cair borda fora, cada vez mais e mais cidadãos.

No tempo que por aí vai, em que os números se sobrepõem às pessoas, e onde campeiam as teorias que defendem que o mundo é de prezas e de predadores, desenha-se um novo figurino para aquilo que deve ser a nossa vida, depois de termos estado ao que dizem, um patamar acima do nosso lugar.

Ao que se ouve, tivemos muito, habituamo-nos a ter mais olhos que barriga, por isso prescrevem-nos curas de emagrecimento. Cortam-nos à ração, mas esquecem-se que tal como um saco vazio que tomba, também a falta de ânimo e de esperança levam à inércia e ao cair da vontade de fazer mais e melhor.

Os que viram a luz e que teimam em nos salvar mesmo contra a nossa vontade, ao que pensam, a régua e esquadro desenharam um país para deixarmos em herança muito diferente daquele que recebemos e que como pudemos e como nos deixaram, ajudamos a construir mas também a levar ao estado a que chegou.
Orientados por uma bússola em que o Norte surge em forma de referência financeira, e onde falta alguma escala das ciências humanas, no que são diga-se, acompanhados pelos congéneres estagiários de estadistas europeus, cortam a eito, destroem para que algo surja de novo, pelo menos no seu modo de ver, mas não se apercebem de que por este caminho, Portugal vai deixar de ser para todos de igual forma, ainda que pelo menos formalmente continue a ser de nós todos.

Estamos a meio da segunda década do século vinte, teoricamente quando mercê da evolução da ciência a igualdade tem mais chão para medrar, mas as oportunidades repartem-se a cada dia mais desigualmente. Quer dizer, repartem-se as poucas que pontuam, já que se alarga a franja daqueles que nem as cheiram por mais que as procurem.

Oportunidades, não as vislumbram as dezenas de milhar de jovens que depois de se verem com um diploma na mão mais não podem do que ir frutificar para fora do seu país dando os seus proveitos aos outros, bem como as não enxergam os idosos mesmo que ao longo do seu viver tenham aproveitado algumas e boas.

Impiedosamente, sentem-se crescentemente excluídos, como se mais não sejam do que empecilhos ou ervas daninhas porque lhes não rebenta fruto na planta, mesmo que esta adube o solo que nos sustenta.

Mais parece nesta época inverno do nosso descontentamento, que mais vale a morte que tal sorte para quem tem cabelos brancos pintados pelas penas da vida e pelo grande mestre que é o tempo que passa muito depressa depois de ter passado. O que passa, esse é lento, porque lhe falta a motivação e porque o horizonte se encurtou com um muro que não deixa que a vista alcance o arco-íris composto com as cores que sempre aconchegam a alma porque são de esperança.
Roubaram-nos também esta. Quando não toda, que a gente sempre resiste, pelo menos em grande parte.
Então a nós, aos que vivemos por opção ou por obrigação de meio do território nacional para dentro, para o lado da Espanha que pelos vistos também está de não se recomendar, mais parece que nos querem dizer para abalarmos daqui por serem estas bandas impróprias para se habitar, se calhar porque fica muito caro e desequilibra o balancete na contabilidade geral.

Não somente os actuais, como os de antes, os governantes a quem delegamos poderes para nos governar poderão até nem ver. Não sei. O que sei, é que quem veja na sua vila ou pequena cidade, ser encerrado o Posto da Guarda, o Tribunal, a Repartição de Finanças, o Hospital, e por arrasto este e aquele café ou casa comercial, sente que lhe nasce e cresce um sentimento de exclusão. Nada tarda que dê por si a pensar que sofre condenação em degredo por crime cometido noutra vida, já que nesta, erro assim grande, só se for o que respeita a certas escolhas feitas com uma cruzinha em todos os que nos fazem sentir estranhos na própria casa só porque desta se não vê o mar.


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