Passar para o conteúdo principal
Diário de Trás-os-Montes
Montes de Notícias
  • Início
  • Bragança
    • Alfândega da Fé
    • Bragança
    • Carrazeda de Ansiães
    • Freixo de Espada à Cinta
    • Macedo de Cavaleiros
    • Miranda do Douro
    • Mirandela
    • Mogadouro
    • Torre de Moncorvo
    • Vila Flor
    • Vimioso
    • Vinhais
  • Vila Real
    • Alijó
    • Boticas
    • Chaves
    • Mesão Frio
    • Mondim de Basto
    • Montalegre
    • Murça
    • Ribeira de Pena
    • Sabrosa
    • St.ª Marta Penaguião
    • Peso da Régua
    • Valpaços
    • Vila Pouca de Aguiar
    • Vila Real
  • Reportagens
  • Entrevistas
  • Fotogalerias
  • Vídeos
  • Opinião
  1. Início

Sentir-se português em Goa

Retrato de fernando
Fernando Campos Gouveia

Sentir-se português em Goa

Não é por acaso que nos definimos como povo pelo traço característico da saudade. E talvez a maior parte de nós não possamos defini-la em toda a sua significância e em todas as cambiantes do sentido que encerra. Ou, como escreveu José Augusto Seabra, citando Santo Agostinho, talvez a saudade seja um desses símbolos chave que cristalizam, em momentos críticos, as aspirações ainda indefinidas dos que não se resignam à fatalidade do pior, nem fecham os olhos diante do abismo, mas buscam, mesmo tacteando, algumas clareiras no presente e no futuro. A saudade pode ser, assim, a cristalização do carácter profundo dum povo.

Prefiro-a assim, abrangente, de contornos indefinidos, para cobrir toda aquela nostalgia dum português pensante, nostalgia que é de um passado ou de um futuro, de todo o tempo e de tempo nenhum, sentimento de alegria e de doce prazer às vezes, delicioso pungir de acerbo espinho noutras, como escreveu Garrett, ou até sentimento de perda e desejo de reencontro com o paraíso perdido ou com Deus, como sentiu Teixeira de Pascoais.

Escrevo esta pequena crónica numa noite de lua cheia que se reflecte sobre as águas calmas do rio Mandovi, em Goa, mais propriamente em Pangim. É que daqui, da varanda fechada do velho Hotel que do rio tomou o nome, onde ainda se fala português com um senhor chamado Camotim, forçado a chamar-se agora mister Kamot, faz-se rapidamente a viagem de regresso ao passado, imaginam-se facilmente as caravelas subindo o rio, ouvem-se ainda os canhões de Albuquerque e sucessores, adivinha-se a epopeia da fixação dum povo vindo do outro lado do mundo para se enquistar aqui, nesta terra de monções e maleitas, quente e húmida, que representava então o futuro do comércio das especiarias.

Passamos pelas ruas escalavradas de passeios altos, levantamos os olhos e reconhecemos as varandas coloniais portuguesas, os telhados de telha de quatro águas, a volumetria das repartições da administração colonial, os nomes importados que aqui criaram raízes e prosperaram ao longo de mais de quatro séculos. E assola-nos então o tal sentimento indefinido a que chamamos saudade: adivinhamos vidas aqui cumpridas, recordamos nas lápides tumulares portugueses sepultados na terra que amaram e fizeram sua, damos conta da miscigenação que se desenvolveu e fez da gente deste hoje minúsculo estado da imensa Índia um povo à parte - um goês é um goês antes de ser indiano - diz-nos o condutor que nos conduz até à praia de Miramar.

É um sentimento estranho, porque vem sempre acompanhado duma nostalgia de epopeias e da frustração dum presente onde mal se pode descortinar um futuro. Já não somos um povo de epopeias, reduzidas que foram estas a umas migrações por essa Europa fora no tradicional desenrascanço de ganhar a vida, e muito menos de quinto império, já que outros nos tomaram esse tipo de megalomanias, e se a única epopeia em que se tornou o duro viver do dia a dia pode ainda autorizar-nos a sonhar com um futuro colectivo, esse futuro não poderá desenhar se senão no espaço geográfico alargado em que hoje compartilhamos alegrias e depressões, sucessos e crises.

Nem por isso devemos sentir-nos menores: as marcas da nossa presença traduzem as realizações de sonhos de um povo que sonha e sempre sonhou com o bem estar muito mais longe da sua porta. Se o acordar do sonho é por vezes penoso, que nos fique dele ao menos uma imagem devolvida pelo espelho da História: talvez não fôssemos melhores nem piores que outros, mas fomos seguramente diferentes. Essa diferença marcar-nos-á certamente também no futuro. Cabe a cada um de nós defini-lo e caracterizá-lo.

Das marcas deixadas, impressionam os monumentos religiosos que caracterizam as nossas descobertas. As monumentais igrejas ou as modestas capelas, donde se destacam naturalmente a igreja do Bom Jesus e a Catedral de Goa. Em construções muito mais modestas que as precederam, ficou patente o cunho da religiosidade dos nossos navegantes, atestado pelas capelas de Santa Catarina e de Nossa Senhora do Monte, mandadas construir por Afonso de Albuquerque. Mas também as edificações militares atestam a nossa presença, sendo de destacar, pela sua dimensão e posição defensiva, o forte da Aguada.

Nestas marcas, como nos nomes ou nas memórias dos que nos reconhecem, temos necessariamente de nos sentir parte duma herança secular, e talvez seja nestas paragens, longe das quezílias de paróquia do nosso viver presente, que encontramos a certeza da nossa identidade colectiva.

Partilhar
Facebook Twitter

+ Crónicas


A ética e a lata!
Publicada em: 11/01/2013 - 01:31
Mudar de vida !
Publicada em: 23/11/2012 - 00:48
A culpa é da Alemanha?
Publicada em: 10/10/2012 - 22:50
Há uma linha que separa!
Publicada em: 16/09/2012 - 03:27
Licenciaturas por inerência
Publicada em: 05/07/2012 - 15:46
Um Presidente piegas!
Publicada em: 11/03/2012 - 17:24
Roubam-nos a Pátria!
Publicada em: 19/12/2011 - 19:38
A reforma das autarquias
Publicada em: 06/10/2011 - 01:30
Nó górdio
Publicada em: 30/05/2011 - 01:11
A orquestra do pintelho
Publicada em: 16/05/2011 - 22:16
  • « primeira
  • ‹ anterior
  • 1
  • 2
  • 3
  • 4
  • 5
  • 6
  • 7
  • 8
  • 9
  • …
  • seguinte ›
  • última »

Opinião

Retrato de Preto
Ana Preto
Bragança sob jurisdição espanhola
07/03/2021
Retrato de Paulo
Paulo Fidalgo
O perigo do negacionismo
07/03/2021
Retrato de luis
Luis Ferreira
A aVentura
06/03/2021
Retrato de igreja
Manuel Igreja
Os tolos míopes e a História
04/03/2021

+ Vistas (últimos 15 dias)

ASAE encerra Continente de Vila Real
// Vila Real
Minas de ferro de Moncorvo exportam primeiras 50 mil toneladas para a China
// Torre de Moncorvo
Alegada vacinação ilegal contra a Covid-19 em Valpaços
// Valpaços
Homem encontrado morto na rua em Bragança
// Bragança
Dois feridos graves em colisão que envolveu uma carroça
// Carrazeda de Ansiães

Publicidade Google

CRONISTAS

Retrato de monica
Mónica Teixeira
Retrato de parafita
Alexandre Parafita
Retrato de batista
Vítor Batista
Retrato de Guerra
Luis Guerra
Retrato de Paulo
Paulo Fidalgo
Retrato de Angela
Ângela Bruce
Retrato de fernando
Fernando Campos Gouveia
Retrato de Bandarra
Carlos Ferreira
Retrato de Joao
João Pedro Baptista
Retrato de magda
Magda Borges
Retrato de henrique
Henrique Ferreira
Retrato de leon
José Leon Machado
Para sugestões, informações ou recomendações: [email protected]

Formulário de pesquisa

Diário de Trás-os-Montes

© Diario de Trás-os-Montes (Desde 1999)

Proibida qualquer cópia não previamente autorizada.



  • Ficha Técnica
  • Estatuto Editorial
  • Contactos
  • Login


Bragança

  • Alfândega da Fé
  • Bragança
  • Carrazeda de Ansiães
  • Freixo de Espada à Cinta
  • Macedo de Cavaleiros
  • Miranda do Douro
  • Mirandela
  • Mogadouro
  • Torre de Moncorvo
  • Vila Flor
  • Vimioso
  • Vinhais

Vila Real

  • Alijó
  • Boticas
  • Chaves
  • Mesão Frio
  • Mondim de Basto
  • Montalegre
  • Murça
  • Peso da Régua
  • Ribeira de Pena
  • Sabrosa
  • St.ª Marta Penaguião
  • Valpaços
  • Vila Pouca de Aguiar
  • Vila Real

Secções

  • Douro
  • Trás-os-Montes
  • Livros
  • Mirandês
  • Emigração
  • Diversos
© Diário de Trás-os-Montes