Costuma dizer o nosso povo, que certas coisas quando nascem tortas, tarde ou nunca endireitam. Com algum abuso, e se calhar com algum despropósito até, lembrei-me disto, ao vir-me á ideia a Casa do Douro, que há uns dias a esta parte, celebrou os seus setenta e cinco anos de vida. Não são poucos os anos decorridos sobre a acção dos “ paladinos do Douro” que a fizeram surgir, bem se sabe que há instituições bem mais antigas, mas convenhamos que três quartos de século de vida, sempre são três quartos de século, e convenhamos também, é idade suficiente para se ser objecto de respeito como é de bom tom e se recomenda.
Não me parece contudo que seja bem este o caso. Por motivos diversos e com culpas para tudo e para todos, basta estarmos um pouco atentos, para desde logo concluirmos da desatenção, e da falta de respeito de que a instituição representativa da lavoura duriense tem sido objecto. Goste-se ou não do papel que por ela tem vindo a ser e é desempenhado por intermédio das pessoas que a dirigem, e coloquem-se ou não outras em bicos de pés para lhe subtrair a representatividade, o certo é que ela é pelo menos ainda, a mais abrangente e a mais representativa organização dos pobres produtores de vinho desta rica região.
Tão rica é que produz uma das maiores e melhores riquezas nacionais, e tão importante é, que o seu produto é há décadas para não dizer séculos, um verdadeiro embaixador de Portugal nos quatro cantos do mundo. Aliás, a riqueza é tanta, que desde sempre, desde que começou a fazer monta, passa de duzentos e cinquenta anos, logo causou atritos entre classes de actividade, e logo fez com que o poder central lhe deitasse o olho e a mão para retirar os seus proveitos.
Não fez contudo essa riqueza infelizmente que a palavra “ crise” fosse ou seja desconhecida pelas bandas do Alto Douro Vinhateiro, como bem sabemos de ontem e de hoje. O próprio surgimento da Casa do Douro em 1932 resultou de um cenário de crise profunda. Ela foi na época a resposta corporativa encontrada para os caminhos que se procuravam, dentro de um Estado Corporativo, totalitário, mas que entendeu sempre ser desejável e essencial a existência de uma organização profissional forte, e de mais um conjunto de regras suficientemente fortes e eficazes para fazerem funcionar minimamente equilibrada a viticultura duriense. Isto aliás, seguindo aquilo que já duzentos anos antes, se havia entendido como necessário.
Foi desta noção que nasceu a Casa do Douro, e foi por ela que se manteve a sua existência até há ainda não uma mão cheia de anos. Mas mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, e mais parece que a democracia se não dá bem com a Casa do Douro, de tantas serem as desatenções para não dizer atropelos vindos de Lisboa sobre ela. Com um pouco de abuso, para não se confundir estritamente os interesses dela com os da própria região, quase se diria que é a própria região no seu todo, quem não tem recebido os olhares atentos e devidos por parte de quem ao longe decide. Será por os votos serem pouco em termos de números…
A prova do desinteresse, para não dizer desleixo, é que nas comemorações do 75º. Aniversário da Casa do Douro, o governo da república, nem sequer um simples rascunho em jeito de mensagem enviou, quanto mais um titular de cargo governamental. Num país, onde até para inaugurar um curso de costura vai no mínimo um secretário de Estado, concordemos que é sintomática semelhante coisa. Haverá motivos pessoais ou institucionais como justificação, digo eu, mas que não se aceita, lá isso não! Eu por mim, fico no que me perece. E você?