Manuel Igreja

Manuel Igreja

Nada Tarda e Vai Tudo pró Catano.

O autor deste escrito que aqui vos deixo, ignorante se confessa em quase tudo e muito mais em coisas de fogo. Consegue acender um fósforo depois de muito riscar, e então isqueiro nem pensar. Tem umas noções básicas de memória de quando em estadias na aldeia vai acendendo a lareira, o lume, depois de muito penar. Sobre ele pouco mais.

Mas como dizia a sinistra PIDE, isto anda tudo ligado. Incêndios devastadores no verão, cheias de tudo arrasar no inverno, comboios que não param porque nem chegam a andar, autoestradas largas e com muito à vontade no se circular por serem escassos os carros a rolar. Caras para fogo como dizem os brasileiros. Nossos irmãos que Deus cuide que bem necessitam.

Pois bem. Mas porque é que mais de quarenta anos depois do brotar da democracia em Portugal, ainda se pode afirmar que isto anda tudo ligado, estou mesmo a ver vossas senhorias a perguntar, partindo do princípio que a democracia não mirrou, e só isso dava para demorarmos no ponto muito mais que uma trintena de novenas.

Sucede que na minha modesta opinião tudo se liga. Até dizem que a vida é assim tipo uma meada de fios que se entrelaçam de ponta a ponta. Mas não é isso que agora monta. Ou antes, que importa antes que me desvie por outras vielas e vá dar nem sei aonde que esta caneta quando lhe dá para deambular de bico ninguém a estanca.

Vem daí então que, tudo se liga. O Estado Novo caiu há quarenta e quatro anos, parece que foi ontem, mas deixou réstias. Ficou-nos dele uma mentalidade vincada que passa de geração em geração inóspita para a cidadania, e ficou-nos um país que vamos acartando, mas que muito mais do que uma Nação, é uma confederação de grupos de interesses. De lóbis, como é fino e soe dizer-se.

O Estado enquanto forme de organização existe, mas tem como finalidade única a sua preservação sugando recursos para se alimentar e servir os proveitos de quem mexe os cordelinhos com garantia de prebendas para quem o gravita graças à sua força de atração e capacidade de distribuição.

Por isso se construíram autoestradas onde quase não podemos andar, por isso se desmantelou e desmazelou o caminho-de-ferro para nelas nos obrigarem a andar, e por isso apesar de muitas juras de que para ano é que não vai ser, mal torra o sol, ardem os montes e secam as fontes neste canto à beira mar plantado.

No ano que passou vimos o inferno vir à terra. Morreram para cima de cem pessoas. Choramos sentidamente e juramos com cruzes te arrenego satanás com toda a convicção. O país gastou milhões a dar com um pau para se equipar com meios de combate aos incêndios. Fez bem, mas gastou mal.

Começou a casa pelo telhado e pelo lado errado. Não deu a devida atenção à prevenção, esquecendo o dito antigo que refere que mais vale prevenir que remediar. Interessou. É que sucede que um lado dá muito mais visibilidade e enche mais os bolsos de uns poucos que o outro. Por isso, se aposta muito no espectáculo antes de se ver se o palco está firme.

O incêndio na serra de Monchique é a evidência. A prova provada. Ninguém viu a tempo que tinham de se abrir por exemplo vias de acesso para as viaturas de socorro. Agora arde e ninguém lhe chega ao pé para bufar, salvo seja que aquilo só com muito malhar e com muito molhar.

Isto anda tudo ligado. Vai sendo tempo de isolar e de avançar. Urge que um país feito horta retalhada em embelgas de colheita de somente alguns, passe a ser um terreno de iguais direitos e iguais deveres. A não ser assim, nada tarda e vai tudo pró catano.


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