Teresa A. Ferreira

Teresa A. Ferreira

Mansos sim, cornos não

     Mansos sim, cornos não!     

 

Todos os edis de Mirandela, sem exceção e com enorme pesar, têm votado as freguesias do município ao esquecimento. Fortíssima concentração de dinheiros gastos na cidade, enquanto as restantes localidades vivem das migalhas que lhes caem na beira do prato. Aqui se denota a enorme falta de visão estratégica ao não perceberem que o município não é a cidade, nem se pode resignar aos jardins, alheiras e festas da Sr.ª do Amparo. Há enorme riqueza patrimonial - cultural e natural - espalhada pelas freguesias, que urge estudar, preservar, valorizar e divulgar. É aqui, meus caros, que se deve apostar para trazer turismo de qualidade e, com isso, riqueza ao município.

Temos uma das três melhores pontes romanas do país, classificada como Monumento Nacional, em Torre de Dona Chama, é a Ponte da Pedra sobre o rio Tuela. E pasme-se: tem trânsito viário. Vejam bem o infortúnio a que está votado este monumento. Nesta ponte passa a via Romana XVII, que liga Braga a Astorga – Espanha.

O Castro de São Brás, em Torre de Dona Chama, classificado como Imóvel de Interesse Público, não tem uma única placa descritiva, informando os visitantes sobre o que podem ver em tão importante Sítio Arqueológico. Tem duas linhas de muralhas, uma sepultura antropomórfica trapezoidal medieval, uma sepultura romana, um lagar romano, fornos de fundição de ferro, imenso material arqueológico à superfície e tanto para descobrir.

Fui informada de que neste Verão irá para lá uma equipa de arqueólogos da Universidade de Coimbra, para iniciarem trabalhos - sondagens. Sendo a origem deste Castro na Idade do Bronze Final, estendendo-se a sua ocupação até à Idade Média, há com certeza imenso material relevante para ser estudado.

E aqui temos de ter atenção: a edilidade tem intenção de levar os materiais recolhidos no Castro para um museu em Mirandela. Isto, meus caros, a ser verdade, vai levar os mansos a virarem Padeira de Aljubarrota! Contem comigo na linha da frente.

Que se faça um Centro de Interpretação junto ao Castro de São Brás, assim como um Museu em Torre de Dona Chama, devidamente equipado e com pessoal técnico, aberto ao público todo o ano.

É com enorme dor que vos informo: todas as moedas encontradas no Castro de São Brás estão na Coleção de El’ Rei Dom Luís, Casa da Moeda, Lisboa; e, vejam bem, nenhuma moeda tem a proveniência. Uma nota informativa diz quem a cunhou e em que ano, mas nada refere sobre o local onde foi encontrada. As nossas moedas estão lá, perdidas, naquele conjunto de moedas, sem acrescentarem qualquer valor à nossa terra.  

Visitando o Museu Nacional de Arqueologia - Lisboa, encontrei achados arqueológicos de Torre de Dona Chama, assim como no Museu Abade Baçal - Bragança. E Torre de Dona Chama? Por que razão esses materiais, e outros, não estão na terra, expostos ao público, num museu digno?

Ai o Pelourinho e o Berrão…

Símbolo da independência administrativa, e não só, que Torre de Dona Chama alcançou ao longo de 562 anos, ergue-se imponente Pelourinho, classificado como Imóvel de Interesse Público, fazendo jus aos três forais recebidos:

Em 1287, a 25 de abril, recebe o 1º foral de D. Dinis;
Em 1293, a 31 de julho, perde o concelho para Mirandela, por não ter pago a renda anual ao rei;
Em 1299, a 25 de março, recebe o 2º foral de D. Dinis;
Em 1303, a 5 de julho, recebe confirmação do foral vigente;
Em 1512, a 4 de maio, recebe o 3º foral de D. Manuel I;
Em 1855, a 24 de outubro, perde o concelho para Mirandela, e assim permanece até à atualidade.

Junto ao Pelourinho está a estátua de um berrão, cuja conceção remonta à Idade do Ferro ou Romanização, não há certeza, apenas o sexo – masculino - está comprovado em três trabalhos científicos. Esta escultura zoomórfica representando um porco ou berrão, foi lavrada numa peça única de granito, de grau grosso, com 1,68 m de comprido. A escultura apresenta no focinho a marcação dos olhos, em covinhas cónicas, com a testa curta, acentuada e inclinada, seguindo-se um focinho grosso e curto, sem marcação de boca; tem simuladas as orelhas pelo saliente correspondente à nuca, estendendo-se para os lados. Na sua retaguarda são representados o ânus e os órgãos sexuais.

Novamente, junto ao Pelourinho e ao Berrão, não há uma placa identificativa com uma explicação de tão importantes símbolos desta terra. A incúria da edilidade perpassa de fio-a-pavio. Custearam uma placa identificativa, míseros trocos para a autarquia, que a Associação Dona Flâmula projetou e concebeu sobre a Ponte da Pedra, e nada mais.

Na aldeia de Guide, anexa da freguesia de Torre de Dona Chama, existe uma igreja classificada como Imóvel de Interesse Público, cujo orago é a São Mamede, e de uma beleza ímpar. Nenhuma placa foi colocada junto à Igreja para ajudar os visitantes a perceberem o que estão a ver. E não me venham dizer que a Igreja não pertence ao Estado, logo não dá… Quando se quer de verdade, tudo se consegue.

A freguesia de Torre de Dona Chama, não tem só Património Arquitetónico; tem a Festa dos Caretos e de Santo Estevão no Natal, que urge inscrever como Património Imaterial Nacional. Vejo este caso a arrastar-se há demasiados anos sem termos nada de concreto. Isto é pior do que as Obras de St.ª Engrácia! Haja paciência para aguentar tanta falta de interesse.

Da sela/ albarda, que ganhou inscrição no Guinness Book, cunho dos artesãos da freguesia de Torre de Dona Chama, por que razão não há divulgação? Há que inventariar e estudar os ofícios e artesãos que há na freguesia, por forma a não se deixar cair tão importantes símbolos identitários. Isto faz parte do Património Cultural Imaterial.

Além do valiosíssimo Património Cultural, temos beleza natural ímpar, nomeadamente perto do rio Tuela. Nem uma praia existe. “Está-se a pensar… mas estas coisas levam tempo…” dizem-nos para calarem o povo pelo que não foi feito até agora.

A gastronomia… a nossa cozinha é divinal e pronto! Quem se lembra de comer um chouriço azedo melhor do que o nosso, no Carnaval ou na Festa do São Brás? Bem torradinho nas brasas, com grelos de nabo macios depois de várias geadas lhe caírem em cima, com uma batata cozida com pele, azeite caseiro e vinho, que também se produz aqui.

Visite a freguesia de Torre de Dona Chama; maravilhe-se com a afabilidade das pessoas; com o saber receber; com a gastronomia; paisagens naturais de perder a respiração; disfrute do silêncio, da tranquilidade e ausência de poluição; e por último, vibre e enriqueça os seus conhecimentos com o Património Cultural:

  1. Ponte da Pedra sobre o rio Tuela, classificada como Monumento Nacional (MN);
  2. Castro de São Brás, Sítio Arqueológico, classificado como Imóvel de Interesse Público (IIP);
  3. Igreja de São Mamede - Guide, classificada como Imóvel de Interesse Público (IIP);
  4. Pelourinho e Berrão, classificado como Imóvel de Interesse Público (IIP);
  5. Igreja de Nossa Senhora da Encarnação, inscrita na base de dados SIPA da Direção Geral do Património Cultural;
  6. Capela e Cruzeiro do Divino Senhor dos Aflitos, inscritos na base de dados SIPA da Direção Geral do Património Cultural;
  7. Escola Primária, inscrita na base de dados SIPA da Direção Geral do Património Cultural;
  8. Ponte dos Vilares, inscrita na base de dados SIPA da Direção Geral do Património Cultural;
  9. Via Romana XVII, passa em Torre de Dona Chama, do Itinerário de Antonino, era uma das Vias Romanas que ligava Bracara Augusta (Braga) a Asturica Augusta (Astorga), passando por Aquae Flaviae (Chaves);
  10. Caretos, celebração do religioso e profano nas Festas de Santo Estêvão a 25 e 26 de dezembro, incluindo: Fogueira Comunitária, Deitar os Jogos à Praça, Roubar os Burros, Desfile da Ciganada e das Madamas, Missa em honra de Stº Estêvão com a Bênção do Pão, Correr a Mourisca, culminando na Tomada do Castelo;
  11. Lagar Romano, é um lagar de vinho construído pelos romanos em rocha granítica única, com dimensões aproximadas de 2,5 X 2,5 X 0,6 m, situado no cimo do Monte do Cercado, em Torre de Dona Chama, possui vista privilegiada para o Castro de São Brás;
  12. Sarcófago e pedras de lagar, conjunto de peças do período de ocupação romana, encontram-se em volta da Igreja Paroquial de Nossa Sr.ª da Encarnação;
  13. Passadiço do Cacho, ponte particular de madeira sobre o rio de Macedo;
  14. Ponte do Moleiro sobre o rio Tuela, Mosteiró.

A freguesia de Torre de Dona Chama é composta pelas aldeias de Guide, Mosteiró e Vilares, e pela vila de Torre de Dona Chama.

 

Texto e fotos:

© Teresa do Amparo Ferreira, 13-06-2021

 

Foto 1: Ponte da Pedra sobre o rio Tuela, Romana, Monumento Nacional - Torre de Dona Chama

Foto 2: Pelourinho e Berrão - Torre de Dona Chama

Foto 3: Berrão de Torre de Dona Chama

Foto 4: Careto -  Reconquista do Castelo aos Mouros - Torre de Dona Chama

Foto 5: Igreja de São Mamede - Guide

Foto 6: Igreja de Nª Srª da Encarnação - Torre de Dona Chama

Foto 7: Passadiço do Cacho - Torre de Dona Chama

Foto 8: Ponte do Moleiro - Mosteiró

Foto 9: Sepultura antropomórfica trapezoidal medieval no Castro de São Brás - Torre de Dona Chama

Foto 10: Lagar de vinho, Romano, no Monte do Cercado - Torre de Dona Chama

 


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