Passa hoje (2 de Dezembro de 2007) um ano sobre a morte do Prof. Fernando Real, uma das figuras mais marcantes da História de Trás-os-Montes. Porque a Região tem para com ele uma dívida de gratidão eterna, impõe-se que o silêncio e a indiferença das novas gerações jamais ousem recair sobre a sua memória. E daí a oportunidade desta evocação.
O Prof. Doutor Fernando Nunes Ferreira Real, Professor Catedrático em Mineralogia e Geografia, ex-Reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, ex-Secretário de Estado do Ensino Superior e ex-Ministro do Ambiente e dos Recursos Naturais, nasceu em 7 de Janeiro de 1923 em Camarate, Lisboa. Licenciou-se em Ciências Geológicas em 1950 na Faculdade de Ciências de Lisboa onde igualmente se doutorou, em 1960, com uma tese intitulada “Introsões Kimberlíticas da Lunda: contribuição para o conhecimento do Karroo de Angola” Esta mesma tese foi distinguida no ano de 1960 com o Prémio Abílio Lopes Borrego – Academia das Ciências de Lisboa.
Geólogo de formação dedicou grande parte da sua vida à investigação e à docência universitária nas antigas colónias do Ultramar. Foi geólogo na Companhia de Diamantes de Angola, foi membro da Brigada de Protecção Mineira da Missão de Fomento e Povoamento de Zambeze (Moçambique) e foi Vice-Reitor e Reitor da Universidade de Luanda.
Passos de gigante
Após o 25 de Abril de 1974, regressou a Portugal, tendo sido destacado para o Instituto Politécnico de Vila Real (IPVR) em 1975, quando este dava ainda os primeiros passos. Fixou residência na Quinta de Montezelos, nos subúrbios da cidade, onde, nas horas de recolhimento, era também agricultor e zoólogo. No “Politécnico” manteve-se até 1978, ano em que foi nomeado em comissão de serviço Presidente da Junta de Investigação Científica do Ultramar (actual Instituto de Investigação Científica Tropical). Dois anos depois foi nomeado Reitor do Instituto Universitário de Trás-os-Montes e Alto Douro (IUTAD), entretanto criado por reconversão do Instituto Politécnico, e em 1985, foi chamado para o cargo de Secretário de Estado do Ensino Superior.
E foi enquanto Secretário de Estado do Ensino Superior que o IUTAD foi elevado à categoria de Universidade, nascendo assim, no ano de 1986, a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), perante o reconhecimento do Ministério da Educação de que o então Instituto Universitário de Trás-os-Montes e Alto Douro (IUTAD) vinha desempenhando uma intensa actividade nos domínios do ensino e da investigação científica e tecnológica, bem como no desenvolvimento regional, considerando reunidas as condições legais para a sua conversão em Universidade.
O Prof. Fernando Real foi Reitor entre 1987 e 1990, num período de grande afirmação da Universidade, designadamente na sua dotação com modernos edifícios e na obtenção de importantes apoios técnicos e científicos internacionais. Um dos mais importantes pertenceu ao Governo Holandês, que permitiu não só a construção de instalações definitivas, como também a aquisição de equipamentos didácticos e científicos, arranque de laboratórios e a concessão de bolsas e realização de estágios de docentes e investigadores nos Países Baixos.
Neste contexto, teve grande impacto, quer nacional quer internacional, o Doutoramento “Honoris Causa” com que foi distinguido o Primeiro-Ministro dos Países Baixos, Ruud Lubbers, e de que foi Padrinho o então Primeiro-Ministro de Portugal, hoje Presidente da República. Estávamos em 10 de Dezembro de 1989. Nesse dia eram também inaugurados os edifícios da Reitoria, Engenharias e Serviços Sociais. Toda a Comunicação Social, incluindo internacional, deu ao evento um eco invulgar. A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro passou a ser considerada um verdadeiro fenómeno de qualidade, de dinamismo e de inovação.
O Prof. Cavaco Silva mostrava-se deslumbrado com toda a obra que vinha sendo realizada em Vila Real e deixou mesmo falar a emoção nas entrevistas que deu, referindo-se ao talento e à ousadia de Fernando Real.
Empreendedor e visionário
Menos de um mês depois, em 5 de Janeiro de 1990, Cavaco Silva ao pretender introduzir uma nota de inovação no seu Governo, criando um Ministério que há muito se vinha tornando necessário, não hesitou em chamá-lo para fazer arrancar do zero esse empreendimento. Assim nasceu o Ministério do Ambiente e dos Recursos Naturais. Fernando Real foi também o seu fundador, mantendo-se como Ministro até Abril de 1991.
Entretanto, em 20 de Junho de 1990, aposentara-se como Reitor da UTAD. Já não regressou, por isso, a essas funções ao deixar o Governo. Contudo, não cruzou os braços. Ainda regressou à Universidade para, no seu seio, fazer arrancar o Instituto de Trás-os-Montes para a Investigação e Desenvolvimento Agro-Industrial (ITIDAI) de que foi o primeiro gestor. Organizou debates, lançou projectos e estudos, especialmente no domínio das energias renováveis.
E como grande visionário que era, logo percebeu que na energia eólica poderia estar uma grande fonte de recursos e de riqueza para esta Região, como hoje se confirma.
Alguns ainda se lembrarão de o ver a andar, sozinho pelos montes, com um aparelho rudimentar, a medir a velocidade do vento. Os pastores achavam aquilo tudo muito esquisito. Ninguém sabia o que ele andava a fazer. Contudo, Fernando Real era um sonhador com pés bem assentes. O seu espírito visionário já então se fazia sentir. Mais tarde, foi ele um dos grandes impulsionadores em Portugal do aproveitamento da energia eólica. O lançamento dos primeiros projectos e as primeiras candidaturas europeias foram da sua principal responsabilidade.