Chrys Chrystello

Chrys Chrystello

Do Cristóvão de Aguiar, do Francisco Madruga, dos colóquios da lusofonia

413.

Tinha desde há muito para ler em agosto, pretensiosamente fingindo que estava de férias, um dos livros de Cristóvão de Aguiar das suas Obras Completas que eu desconhecia e que decidira ir fruir lenta e devagarosamente para melhor aprender. É o volume X, Memórias e Evocações de Gente com Quem (Con)Vivi  com excelentes incursões nas memórias de amizades profundas com Paulo Quintela, Miguel Torga e Vitorino Nemésio. 

Porque sou amigo dele (se bem que recente, desde 2009) e sei da sua relação privilegiada com aqueles mestres tenho-me deliciado na leitura e ponderado sobre a importância da amizade e seu caráter intemporal. Conheci o autor quando o convidei para estar presente no 11º e 12º colóquios da lusofonia (respetivamente na Lagoa e em Bragança).

 

Nessa altura conheci o seu editor Francisco Madruga, um conterrâneo meu transmontano de Vale da Madre, Mogadouro (onde tenho família) com o qual se criaria outra amizade sólida e viria a ser Presidente do Conselho Fiscal dos Colóquios até hoje, além de ter editado várias obras nossas (antologias, ChrónicAçores, etc) e de vários autores nossos associados. O Madruga foi ali lançar essa satírica obra do Cristóvão Os Cães Letrados, que muitos sorrisos me arrancaram.

Com o tempo acabei por conhecer a família do Francisco Madruga, a sua mulher médica e as filhas com quem privamos ao longo dos anos, quer no ambiente dos colóquios (Bragança, Brasil, Macau, Santa Maria, Montalegre, Graciosa, Lomba da Maia, etc., ) quer em repastos de posta mirandesa, matando as minhas saudades da mátria Bragança que ele sempre teve o cuidado de preparar quando passava no norte de Portugal.

 

A vida, como todos sabem, não tem sido fácil para ninguém nesta pandemia, isolamentos profiláticos, confinamentos, adiamentos e cancelamentos de colóquios, a quebra involuntária dos laços e do contacto fiel duas vezes ao ano nos nossos colóquios, e um sentimento de eremita à força que me tem perseguido. A isto acrescem os cuidados adicionais com a débil saúde da minha mulher e a tentativa de evitar qualquer contágio que a debilite mais, o que criou um afastamento involuntário de contacto humano por razões preventivas.

 

Dito isto contam-se pelos dedos de uma mão os encontros com pessoas queridas, familiares e amigas ao longo deste tormento pandémico e cada um deles, tem-nos enchido de alegria e da falsa sensação de regresso à  vida que nos andam a tirar desde o começo da pandemia.

Pois bem, o amigo Madruga que já conhecia quase todas as ilhas (onde os colóquios foram e não foram) há muito tinha prometido vir conhecer as que lhe faltavam, Flores e Corvo, e sobre as quais perorá, decerto, mais tarde nos seus escritos que vem dando a conhecer como a continuação do seu primeiro livro  Histórias (de) Vida.

Logo que a malha apertada das restrições o permitiu assim o fez e marcou encontro connosco no regresso a penates em que passaria a noite em São Miguel. Para o caso não interessa, mas fica aqui a ressalva de que continua a haver “overbooking” e o Hotel para onde reservaram mandou-os para outro na outra extremidade de Ponta Delgada, o que será bom sinal de retoma económica dum setor muito afetado pela pandemia.

 

Entre as 20 e as 23 passamos três horas de amena cavaqueira recordando inúmeros episódios que ficaram na memória, alguns dos quais  não tinham sido presenciados pela sua mulher, filha e genro que  connosco jantaram. Uns mais hilariantes, outros mais banais, evocando os nossos patronos Malaca Casteleiro (recentemente falecido) e Evanildo Bechara nestes últimos doze anos. Recordamos momentos alegres com o bon vivant Vasco Pereira da Costa, o Vamberto Freitas, Álamo Oliveira e tantos outros a quem chamamos amigos e que nos ajudaram a construir os Colóquios da Lusofonia.

E durante essas horas enganamos a saudade e vivemos a ilusão da vida como era antigamente. Para isso, servem os amigos e agradeço esta oportunidade de regressar por momentos à memória de tempos idos, apenas enevoada pelas máscaras que usávamos nos intervalos do repasto.

Chrys Chrystello, Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713
[Australian Journalists' Association MEEA]
Diário dos Açores (desde 2018)
Diário de Trás-os-Montes (desde 2005) 
Tribuna das Ilhas (desde 2019)
Jornal LusoPress Québec, Canadá (desde 2020)

 

 


Partilhar:

+ Crónicas