Não é que venha lá muito para o caso, mas este artigo está a ser escrito estando eu sentado junto à Sé de Bragança, com a silhueta da bela torre do Castelo bem visível, altaneira de bandeira desfraldada ao vento.
O tempo que sobra até à hora do jantar, o esvoaçar do espírito, e o gosto por certas coisas, levaram-me a olhar para a degrada parte histórica da cidade, que à semelhança de outras em outras cidades, deixamos ao abandono e à degradação que o tempo inexoravelmente provoca.
Portugal de fio a pavio, é um não findar de Centos Históricos degradados, de belas casas com paredes sujas, de janelas escancaradas e tectos a ruir. Mas felizmente a situação tente a inverter-se, e porque apareceram fundos da Comunidade Europeia para tal, e também porque novas mentalidades foram surgindo, vão-se recuperando e bem, muitos Centros Históricos por esse país afora.
As terras e as suas gentes, vão ganhando orgulho nos testemunhos do seu passado, e vão assumindo as suas memórias como algo imprescindível no presente para a construção do futuro comum que sempre se deseja melhor.
Durante anos e anos no entanto, não foi assim. Bem antes pelo contrário, fugiu-se a sete pés de tudo o que indiciava antiguidade, numa autêntica fuga para a frente, que mais não foi do que um conjunto de passos para trás, rumo a uma modernidade saloia sem sentido e sem bom-senso.
Nesta mentalidade, deixaram-se ao “ deus-dará” belíssimos e imponentes centros urbanos, de onde saíram os homens e entraram os ratos. Multidões de operários, e ávidos mestres – de – obras, construíram então as cidades para os outros, em descampados e em terras férteis, no mais pleno endeusamento do betão armado e dos edifícios erguidos ao alto, quantas vezes com a maior falta de gosto e de enquadramento estético.
Durante décadas e décadas, muitos de nós viveram na convicção de que morar-se num apartamento era a mais refinada maneira de se mostrar civilizado e longe de uma tida como vergonhosa condição de aldeão, que por força das circunstâncias, era sinónimo de rudeza no trato e de baixa condição.
Fomos então abandonando também por isso, mas não só, aldeias, vilas e partes antigas de cidades, ao mesmo tempo que tornamos feias as nossas paisagens com os mamarrachos que como cogumelos espalhamos sem rei nem roque ao jeito de uns tantos.
Não soubemos ou não quisemos como por exemplo ali ao lado , em Espanha, manter-nos até ao possível, dentro das cidades que já existiam, e como rebanho de barriga cheia, desprezamos o que tínhamos á mão, viramo-lhes as costas, e fomos alegre e inconscientemente à procura de um mundo que supunha-mos mais avançado, e com uma qualidade de vida que afinal foi mais pretendida do que sentida ou vivida.
E é isto. Aqui na cidade medieval de Bragança, é o fim de tarde do primeiro dia deste Verão que se anuncia quente como é sua obrigação. Passado este escorrer de tinta, a penumbra já se anuncia sobre os telhados das casas centenárias.
Não tarda nada, no meio das ruas desertas, com um pouco de imaginação, poderão ser vistos os fantasmas dos que nos procederam, e que vá lá saber--se porquê, abanam a cabeça e deitam ferozes olhares reprovadores.
Centros históricos

Centros históricos
+ Crónicas
Publicada em: 03/04/2021 - 15:32
Publicada em: 19/03/2021 - 12:57
Publicada em: 13/03/2021 - 14:19
Publicada em: 04/03/2021 - 21:44
Publicada em: 20/02/2021 - 14:07
Publicada em: 15/02/2021 - 09:49
Publicada em: 06/02/2021 - 15:27
Publicada em: 31/01/2021 - 09:51
Publicada em: 23/01/2021 - 12:57
Publicada em: 16/01/2021 - 14:24