Esta condição de «clandestinidade» tem-lhe impossibilitado o acesso a bens e serviços que a maioria dos portugueses não tem qualquer dificuldade em conseguir. Sem BI, o jovem de Chacim não pode casar com a mulher com quem partilha o lar, não pode dar o nome ao seu filho, Tiago Filipe, de dois anos, nem sequer abrir uma conta bancária. Como se isso não bastasse, a falta de documentação impossibilita-lhe também o benefício do Abono de Família e de qualquer protecção social.
Tudo começou em 1977, quando o pequeno Amorim Augusto Silva foi registado em Pamplona (Espanha), onde nasceu. O assento de nascimento foi assinado pelo pai, Manuel António Silva, e por Fernanda Augusta Silva, que não era a mãe do bébé, mas na altura vivia com o progenitor.
Em 1980, Amorim Augusto Silva é levado para Portugal, tendo sido registado como cidadão português, mas já com o nome da verdadeira mãe, Maria Adelina. No entanto, foi registado como um recém-nascido embora já contasse 3 anos de idade.
Aos 15 anos, o jovem começa a pensar em tirar a carta de condução, apesar de, oficialmente, a idade não lhe permitir concretizar este projecto. Apercebendo-se de que nos registos espanhóis já contava 18 anos de idade, Amorim Silva tenta regularizar a sua situação em Portugal duma vez por todas. Ou seja, quis registar-se novamente com o nome da sua verdadeira mãe e com os 18 anos que realmente possuía na altura.
Para tal, teve de proceder à anulação do registo que havia sido feito em 1980, uma decisão que lhe está a custar caro, pois caiu num processo burocrático que se arrasta há cinco anos.
Desesperado, Amorim Silva culpa agora as autoridades portuguesas de o terem deixado sem nacionalidade. «Anularam-me os dois registos ao mesmo tempo e agora não tenho papéis nem de Portugal nem de Espanha», lamenta.

Apenas uma cédula

Apesar de todos os contratempos, o jovem conserva ainda uma cédula datada de 1980, altura em que foi registado pela primeira vez em Portugal. Mais tarde, Amorim Silva ainda chegou a ter um BI e número de contribuinte, mas quando quis alterar a idade e ficar com o nome da verdadeira mãe, nunca mais teve uma vida normal.
Para tentar resolver a situação, a família deslocou-se a Espanha há cerca de um ano, mas os serviços espanhóis encaminharam o processo para o Registo Civil de Macedo de Cavaleiros. Amorim Silva diz-se cansado de esperar e mostra-se preocupado com o seu futuro. «Isto já devia estar resolvido. Eu não posso andar assim, mas se a Guarda me apanhar sem documentos mando-os ir ao Cartório de Macedo pedir explicações», garante o jovem.
A família já recorreu também à Delegação de Bragança dos Assuntos Consulares, mas a resposta foi semelhante às dos serviços espanhóis. «Disseram-me que tinha de resolver a coisa em Macedo, mas eu não sei do que é que estão à espera, pois a senhora que me deu o nome já foi ao tribunal dizer que não é a minha mãe», lamenta Amorim Silva.
O jovem diz que os serviços do Registo Civil de Macedo de Cavaleiros o têm aconselhado a esperar, alegando que o processo já foi encaminhado para os Serviços Centrais do Registo Civil, em Lisboa. No entanto não abre mão da sua pretensão, que quer ver satisfeita o mais rapidamente possível. «Quero ser português, ser registado com o nome da minha mãe e com a minha idade verdadeira», garante, acrescentando que quer dar um futuro melhor ao pequeno Tiago Filipe, que no próximo mês de Fevereiro completa três anos.

Pai tem de colaborar

O DTOM contactou um dos responsáveis pela Conservatória do Registo Civil de Macedo de Cavaleiros que remeteu grande parte das responsabilidades para o pai de Amorim Silva. «Houve dois registos com duas pessoas diferentes a servirem de mãe: uma fictícia, no registo feito em Pamplona, e outra verdadeira, que deu o nome no assento feito em Portugal», revelou a fonte.
O responsável admite que Amorim Silva «realmente não consta dos registos portugueses, pois o assento realizado em 1980 foi cancelado, devido à existência de declarações contraditórias». Segundo a mesma fonte, Fernando Silva é o grande responsável por esta situação. «O pai fez uma série de declarações falsas, nomeadamente em relação à mãe do jovem, que criaram este embaraço todo, e se ele não for a Espanha rectificar tudo, mesmo que sofrendo algumas consequências, dificilmente se resolve a situação». Este elemento da Conservatória do Registo Civil macedense garante que «o assento de nascimento feito em Pamplona tem de estar arquivado», tendo acrescentando que o registo de Amorim Silva em Portugal «terá de ser feito nos Serviços Centrais do Registo Civil, baseando-se num documento passado pelos serviços espanhóis». O responsável reconhece, porém, que as contradições existentes em relação à mãe do jovem poderão complicar o processo, embora a via judicial possa resolver a situação definitivamente. «O problema disto tudo são as contradições e as falsas declarações. De qualquer forma, o jovem pode até ter documentação espanhola mas o pai tem de se dispor a ir a Pamplona e colaborar para que o problema se resolva», garantiu a mesma fonte.
Uma coisa é certa, enquanto as questões burocráticas não ficarem resolvidas o jovem Amorim Silva vai continuar a viver na clandestinidade, embora não tenha culpa das irregularidades cometidas na altura em que não tinha idade para decidir e foi feito o seu primeiro assento de nascimento.



PARTILHAR:

Piddac 2001 não contempla novas instalações

Vila Real, Chaves e Macedo