Manuel Igreja

Manuel Igreja

Quero um Comboio como o de Caíde

De oras em quando vou ao Porto de comboio. Moro na Régua, para quem não sabe mesmo que isso pouco ou nada importe, e sempre que tenho de me deslocar à cidade grande em viagem assim tipo uma escanchinha e vou sozinho, utilizo o caminho-de-ferro de quem sou férreo adepto e defensor.

Mais até, uma das cosias que mais lamento que tenha sucedido neste nosso belo país, é que aquando da enorme oportunidade de melhoria e de modernidade, se tenha por saloiice abandonado a via férrea por troca com a rodovia. Em todo o mundo que conta se sabia que ela é o meio de transporte do futuro, mas nós somos assim. Mas pronto, o mal está feito.

Mas mudando a agulha para irmos então mais concretamente à linha do Douro e aos comboios que nela circulam, para não dizer se arrastam depois de terem servido garbosamente em terras de Espanha. Caso fossem seres vivos, diria que os pobres coitados lá vão cumprindo a missão apesar de tudo. Há pontos em que quase me dá para ter pena deles, mesmo que ninguém tenha pena de nós.

Continuo a viagem para confessar antes de mais um pecado. A sério. Que Deus Nosso Senhor me perdoe, mas a páginas tantas dou por mim a sentir alguma inveja, péssima coisa como se sabe. Não é que queira algo que outros não tenham o têm, quero é ter o mesmo ou parecido. Quero toda a gente bem e que eu o esteja de igual forma.

Feita a contrição. Diga-me lá se faz o favor, se por exemplo quando uma pessoa chega a Caíde, uma garbosa estação da Linha do Douro, e vê aqueles comboios pequenos a afiguram-se quase como de brincar, elétricos, rápidos e cómodos, a circularem de e até ao Porto, não é querer o mesmo. Só quem for lerdo ou se tiver como filho de um deus menor é que tal não almeja.

Que eu saiba tanto eu, como qualquer uma das pessoas que me leem, não nos temos em semelhante avaliação. Dado isso, qualquer sentimento menos nobre nos é perdoado. Digo eu. Se não logo se arranja maneira de se ir até ao Santo Padre e a absolvição é mais que certa.

Tenho para mim que imperdoável é outra coisa. Sem perdão, é o não sermos capazes de impedir que nos deitem ao abandono porque não nos damos ao respeito, é andarmos exclusivamente preocupados com o nosso umbigo, e ficarmos deleitados e inertes quando nos coçam as costas. Isso sim, dá viagem direta para o inferno para junto do mafarrico e para onde ninguém vai em primeira classe.

Prometem-nos que pelo menos até à Régua, a linha vais ser eletrificada e obviamente dotada com comboios que são um brinquinho. A ver vamos. Só espero que seja ainda no meu e no seu tempo. Como sabe dizem que a saúde é um estado transitório que não augura nada de bom, por isso não vale a pena haver ilusões pois não somos eternos.

Mas vamos esperar. Claro que não pode ser sentados e contando ouvir o comboio apitar até porque existe ainda a questão da continuação da Régua para cima, mas isso é mercadoria que vai noutra carruagem.


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