Nuno Magalhães

Nuno Magalhães

Not So Special Two

Os últimos tempos ficaram marcados pelas chocantes declarações do Presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, quando disse que “Não se pode gastar todo o dinheiro em mulheres e álcool e, depois, pedir ajuda.”, numa clara alusão aos países europeus que estiveram sobre resgate financeiro, onde se inclui Portugal. Esta chocante e gravíssima escolha de palavras mereceram (e muito bem!) a reprovação e indignação de grande parte dos dirigentes dos Países Europeus, assumindo Portugal a dianteira na revolta contra estas afirmações. A reação do Governo e da Assembleia da República foi unânime e perentória, o Presidente do Eurogrupo deve um pedido de desculpas a Portugal e não reúne as condições para continuar no exercício do cargo, pelo que deve ser exigido o seu afastamento. Todas as bancadas parlamentares falaram em uníssono e os responsáveis políticos estavam alinhados e comprometidos na demissão de Jeroen Dijsselbloem.

Mas o Governo foi mais além e continuou o ataque feroz (e mais uma vez bem!) ao holandês, com o Primeiro-Ministro, António Costa, a exigir, em diversas comunicações e canais de informação, o afastamento imediato de Dijsselbloem, e com o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, em Washington, a partilhar da exigência de António Costa. Até Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, subscreveu as palavras de António Costa e Augusto Santos Silva, considerando natural o pedido de demissão. A revolta é de tal ordem que António Costa endurece o discurso e afirma que “(..) o populismo não está só naqueles que tem coragem de assumir que o são. Está também naqueles que aparecem com pele de cordeiro, porque fazem discursos que são racistas, xenófobos e sexistas, como o discurso do senhor Dijsselbloem” e considera que “A Europa só será credível com um projeto comum no dia em que o senhor Dijsselbloem deixe de ser presidente do Eurogrupo e haja um pedido de desculpas claro (..)”. O orgulho nacional estava ferido e nada iria travar a nossa demandada pela demissão do holandês, Jeroen Dijsselbloem.

E eis que chega, finalmente, o momento de confrontação com Jeroen Dijsselbloem e o momento para exigir o pedido de desculpas e demissão do Presidente do Eurogrupo, na reunião do Eurogrupo, em Malta. Nesta reunião não está presente Mário Centeno, como seria suposto, mas é o momento do autodenominado “Special Two” entrar em campo. Mourinho Félix, Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e primo de José Mourinho (o Special One), carrega consigo a missão de repor o orgulho nacional. E falha redondamente!

Mourinho Félix, visivelmente nervoso, sem qualquer convicção e, até, sem brio, confronta Dijsselbloem exigindo um pedido de desculpas público a Portugal e aos restantes países que estiveram sobre resgate financeiro. Dijsselbloem, explorando o visível desconforto do Special Two, em bom português, “come-o de cebolada”, rejeitando por completo as palavras de Mourinho Félix e atira acusações de “uma reação chocante de Portugal”. Mourinho Félix, incapaz de esboçar qualquer reação de indignação, engole em seco, baixa a cabeça e resigna-se ao dito pelo holandês. Confesso que esta caricata situação (que outros apelidaram de “palhaçada”) apenas me fez lembrar quando uma criança é injustamente acusada de algo pelos pais e limita-se a aceitar porque tem mais medo das represálias do que vontade de repor a verdade.

Chegamos ao infeliz momento da Paródia Política, em 4 atos:
1.º ato – Segundo veiculado na comunicação social, citando fontes oficiais do Ministério das Finanças, Mário Centeno não pode participar na reunião por se encontrar a tratar de “assuntos diversos”. Bem, tendo a postura do Governo, em especial do seu representante máximo, sido tão severa e determinada na demissão do Presidente do Eurogrupo, parece-me incompreensível que Mário Centeno não assuma a causa nacional e não estivesse presente na reunião que poderia decidir o futuro de Dijsselbloem. Ao invés disso, envia um Secretário de Estado para fazer o trabalho de um Ministro e Mourinho Félix “borra a pintura toda” e só mostra que afinal he is not so Special Two;

2.º ato – Em declarações à imprensa, no final da reunião do Eurogrupo, Dijsselbloem afirma que não chegou nenhum pedido formal para a sua demissão. Entramos no contraditório, afinal não queríamos todos a demissão do holandês? Se assim o desejávamos como nação por que razão os nossos representantes não a exigiram formalmente?;

3.º ato – O “raivoso” António Costa, homem das acusações de “populismo” a Dijsselbloem, o defensor acérrimo do orgulho nacional, o porta-estandarte da demissão de Dijsselbloem, ainda nada disse sobre esta situação. Será que meteu marcha atrás e se escondeu atrás de um Secretário de Estado ou será que teve aulas de controlo de raiva? Parece-me incompreensível a discrepância de posições;

4.º ato – Correu a notícia de que Mário Centeno teria sido sondado para ser Presidente do Eurogrupo. Não farei considerações das motivações ou das “desculpas” para ser recusada um futura abordagem, apenas questiono – Se ninguém pediu a demissão de Dijsselbloem, se Dijsselbloem afirmou que não se iria demitir, como pode alguém ser sondado para um lugar que não está à disposição?

            Conclusão: toda a situação em torno de Dijsselbloem foi um mero espetáculo para consumo interno, quando nunca foi objetivo tomar qualquer medida para, realmente, exigir a demissão do Presidente do Eurogrupo e a reposição do bom nome de Portugal. Não houve qualquer consequência destas desprestigiantes declarações e, pior ainda, Portugal não exigiu, nos locais indicados, qualquer consequência para este desrespeito. Ainda mais, António Costa, afirmou que o Governo "não se ajoelha" perante o Eurogrupo. Mas, se analisarmos bem toda a situação e os resultados de tantas afirmações inflamadas, de facto, o Governo não se ajoelhou, o Governo deitou-se, rebolou e fingiu de morto.


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